Crítica do
Segundo Caderno de O Globo (1/4/2015)
Crítica/ Um Estranho
no Ninho
Texto teatral do americano Dale Wasserman,
baseado em história de Ken Kesey e popularizado pelo cinema, em 1975, no filme
dirigido por Milos Forman e protagonizado por Jack Nicholson, “Um estranho no
ninho” tem desdobramento dramático manipulado com destreza de roteirista que sabe
como atingir o efeito e conduzir a tensão da plateia. Em hospital psiquiátrico,
grupo de internos é submetido a regras terapêuticas restritivas, suprimindo qualquer
liberdade expressiva e limitando o espaço cotidiano à disciplina da rotina. A
chegada de McMurphy, que para evitar a cadeia se torna paciente, subverte o
protocolo do tratamento, mantido imutável por enfermeira despótica. O
entrechoque entre a ordem disciplinadora e a anárquica contestação está no centro
da narrativa que, residualmente, trata de injustiças do sistema social e do
cerceamento das liberdades individuais. Wasserman pretende com esse exemplar de
realismo psicológico enquadrar-se como autor de “peça bem acabada”. O diretor
Bruce Gomlevsky, mais do que encenar, parece ter assumido a atribuição de administrar
carências e organizar funções diante das dificuldades. A exiguidade do palco é
a primeira delas, já que é necessário acomodar 16 atores e o cenário de Patti
Faedo numa área restrita para a intensa ação. Os atores não chegam a se
atropelar, mas a movimentação constante compromete o adensamento dramático. A
presença do veterano de guerra, que poderia contrapor a esquizofrenia paranoica
do personagem ao papel funcional de narrador, é tão somente outro dos
acalorados elementos que o diretor faz questão de ressaltar na superficial exuberância
de gestos, tiques e vozes do elenco. Gomlevsky se restringe à exposição da
trama e a exibir o que emerge como sequência narrativa em intervenção burocratizada.
A composição do elenco, por demais eclética, não atende a um conjunto homogêneo
e equilibrado, evidenciando a irregularidade das atuações. Tatsu Carvalho
(McMurphy) se expande em cena como se
quisesse ocupá-la com protagonismo a todo custo. Helena Varvaki adota rigidez
corporal e de voz como acessório exteriorizado para interpretação sem modulações.
Os demais atores se perdem em excludentes atalhos individuais. “Um estranho no
ninho”, com os problemas que afogam esta versão e que ameaçam sufocá-la em suas
limitações, respira apenas na relação direta e emocional que estabelece com a
plateia, capaz de se deixar envolver, irrestritamente, com o entrecho. A
comunicabilidade, quem sabe, pode ser um valor a ser considerado na difícil recepção
ao teatro nos dias atuais.