quinta-feira, 14 de novembro de 2019

Temporada 2019


Crítica/ “3 Maneiras de Tocar no Assunto”
 
De frente com o preconceito
O título do monólogo, escrito e levado ao palco do Teatro Poeirinha, aponta para a forma como a montagem pretende apresentar aquilo de que trata. Apenas o assunto fica a ser desvendado, somente à partir da primeira das cenas que compõe a trilogia temática: a homofobia. Direta na sua indignação, demonstrativa em seus efeitos, documental em seus registros, “3 Maneiras de  Tocar no Assunto” contrabalança o protesto sócio-político-emocional com o rigor da construção teatral. O ator e autor Leonardo Netto não confronta a plateia, unicamente, com os comportamentos daqueles que levam o preconceito ao paroxismo da irracionalidade. Utiliza-se de planos diversos (bullying, revolta social e discurso político) para apresentar painel interveniente de atitudes reativas e ações contestadoras. Sem qualquer intenção de agit-prop, projeta com dramaturgia cênica mais expositiva do que dramatizada, manifestações homófobas, capturadas na perspectiva de quem as sofrem. Na cena inicial,  a criança-adolescente, submetida a constrangimentos e violência, sob roupagem escolar, se defronta com a sua própria impotência para enfrentar a rejeição agressiva. No caminho, ficam delineados os rumos da tragédia. Na seguinte, de pedras na mão, grupo de gays, lésbicas, travestis, dragqueens, reage contra policiais que invadiram bar em Nova Iorque, há 50 anos. A atitude espontânea e indignada, anuncia o movimento LGBT. E na final, discursos do então deputado Jean Wyllis, entre 2011 e 2018, assinalam o machismo debochado e hipócrita de seus pares. A microfonia do parlamento não abafa a sonoridade límpida do desnudamento. A visão muralista do diretor Fabiano de Freitas propõe traços marcantes de um mesmo embate em tripla refração. Pequenos objetos (uma bacia é imagem de mergulho na tortura), projeções poéticas-documentais (Judy Garland, contraponto à barbárie), e interpretação de emoções contidas (o ator é um corpo descritivo), desenham a cenografia dramatúrgica. E ainda que a encenação carregue, no final, um tanto na ênfase, mantêm-se ao longo da sua duração, equilibrado ritmo narrativo. Leonardo Netto, que além do texto e atuação, assina a trilha sonora (ao lado de Rodrigo Marçal) e seleção de vídeos, tem sua participação completada pela luz sensívelvel de Renato Machadoel luz  naço de Rodrigo Marçal) de Renato Machado. Netto, frontalmente evolvente no episódio do bullying, acidamente “didático” no quadro da pedra na mão, e ironicamente provocativo na cena da casa legislativa, vivencia com integridade as palavras que escreveu.