quinta-feira, 25 de julho de 2013

26ª Semana da Temporada 2013


Em Cena no Espaço Sesc

Crítica/ Vermelho Amargo
Subjetividade com recortes oníricos
O romance de Bartolomeu Campos de Queirós, que deu título e originou a montagem em cartaz no Teatro Eva Herz, é traçado em imagens afetivas com sabor de colorido simbólico e fatiada em cortes oníricos afiados. O percurso das palavras do autor para reaver sentimentos, como o de perda da infância, o desaparecimento da mãe, o esfacelamento dos laços fraternais e a distância paterna, é temperado pelo fruto sangrento da solidão e da passagem do tempo. Nesta imersão em lembranças e subjetividades ressalta o lirismo levemente ácido de uma literatura confessional que Diogo Liberano adaptou e dirigiu, capturando o aspecto imagístico da literatura para estabelecer a conexão narrativa. A versão teatral do romance procura criar uma poética cênica, em que o literário se inflexiona como figura, deixando o dramático em segundo plano, em favor da construção da palavra desenhada. O trio de atores – Daniel Carvalho Faria, Davi de Carvalho e Diogo Liberano – estabelece diálogo com a interpretação como traço, esboço para dar forma ao dito, sem emprestar-lhe intencionalidades explícitas. O que se apropria da escrita é o seu contorno físico, próximo ao sensorial, convertida em forma e movimento que desloca o eixo da ação interior para desdobrar, em abstrato, as camadas narrativas. Neste sentido, a cenografia de Bia Junqueira funciona como uma coautoria com a direção. O piso vermelho, que de início recobre a cena, se revela uma mandala de círculos concêntricos, que se transforma em parangolé. Outra camada do piso fica a descoberto, em seguida, quando se avolumam arestas para que, ao final, surja um quadro ilusório. Mais do que um impactante efeito estético, uma inteligente leitura visual do texto.             

Crítica/ Um Dia Qualquer
Desencontro coletivo de solidão individual
Julia Spadaccini confirma neste texto, em cena na Arena, e a cada nova encenação, o depuramento do seus meios expressivos, demonstrando crescente segurança no domínio da dramaturgia. Nesta narrativa a autora reitera a progressiva instrumentação de sua escrita teatral, desta vez num clima vagamente absurdo com fragmentos realistas. Num banco de praça reúnem-se tipos desgarrados – uma enfermeira destemperada, um burocrata liberal, um palhaço de festa infantil e uma mulher neuroticamente eloquente -, sem razões aparentes que os una, a não ser o fortuito e casual encontro. Num dia qualquer, de uma praça qualquer, registra-se o momento desse encontro. O diálogo entre essas figuras soltas, perdidas em cotidianos melancólicos, solitários, bizarros, prescinde de uma determinada situação. A conversa entre eles é a própria construção dramatúrgica, e é das palavras soltas que Spadaccini preenche o vazio individual que os personagens trazem ao coletivo da praça. Sem inter-relação, cada um monologa com consigo mesmo, como se assemelhassem àqueles pregadores sem plateia que aparecem, eventualmente, em espaços públicos. Alexandre Mello harmoniza o quarteto do elenco – Leandro Buamgratz, Anna Sant’ Ana, Dida Carneiro e Rogério Garcia – às oportunidades de destaque nas atuações sugeridas pelo texto. O diretor mantém a montagem no plano discursivo, buscando encontrar fluência em material que não se baseia em ação e continuidade. O cenário de Daniele Geammal, que instala o banco num piso espelhado, possibilita alguns bons efeitos de luz de Renato Machado, mas fica um tanto prejudicado, dependendo da localização do espectador. A incidência da iluminação no espelho, compromete pela refração o olhar do público.
                                                
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terça-feira, 16 de julho de 2013

25ª Semana da Temporada 2013


Crítica/ A Falecida
Tragédia carioca em enquadramento pictórico
Há em A Falecida, como em tantos outros textos de Nelson Rodrigues, o determinismo da personagem em mergulhar na obsessão, diante da qual a existência se transforma no percurso para realizá-la. Zulmira constrói a morte como vingança da vida, buscando a pompa no fim para justificar as emoções suburbanas de sempre. O que a cerca, no entanto, é bem mais implacável do que qualquer acerto definitivo, e como na consulta à cartomante é ludibriada por justificar a vida pela falsa permanência após a morte. O diretor Moacyr Góes condiciona a sua montagem, em cartaz no Teatro Maison de France, com a execução instrumental da marchinha Cidade Maravilhosa, que abre o espetáculo com o ator Leon Góes vestido de terno branco, rosto coberto de máscara carnavalesca, malemolente em passos de samba. Está desenhado o quadro cênico tipificado como malandro e fixado como imagem cristalizada de certa geografia humana da cidade. Essa conotação quase pictórica, acentua, de maneira niveladora, o conceito de tragédia carioca de A Falecida, subtraindo-lhe o vigor dramático. O que Zulmira se impõe como sina, destino a ser celebrado com a exposição da morte, desaparece em meio a configuração externa, mais retrato do que mergulho. O espetáculo se abriga nesta padronização carioca da malandragem, fragilizando os movimentos subterrâneos daquela que subverte comportamentos impelida pelo acúmulo de frustrações, pretendendo se redimir com o ritual da morte. O tom se desajusta, mais ainda, com o visual (cenário, adereços e figurinos) de Teca Fichinski, que reforça o aspecto jocoso e divertido imposta pela direção. As portas do cenário são parcialmente integradas à movimentação da cena, e os adereços (como o telefone e o uso de um ator como espelho) pouco criativos, além da precária utilização do alçapão. No elenco – dos disciplinados Sérgio Kauffmann, Ricardo Damasceno, Daniel Carneiro e Augusto Garcia, disciplinados – destaca-se a voz de Simone Centurione. Leon Góes, com emissão e interpretação veladas não é provocado a contracenar com Bianca Rinaldi, que permanece mecânica e passivamente linear com uma Zulmira sem viço.       

Crítica/ Rain Man
Versão adocicada de encontro fraternal 
O filme em que é baseada a versão teatral em cartaz no Teatro dos Quatro tinha, além da ótima interpretação de Dustin Hoffman, bom roteiro original,  que conduzia e conquistava com habilidade a emotividade as plateias de cinema no final dos anos 80. Na transposição para o palco, mais de duas décadas depois, as características de origem são mantidas com a igual artesania, repetindo a mesma costura na manipulação das regras de playwriting bem alinhavado. A relação de irmãos, um autista, o outro ressentido com o passado, se estabelece a partir da morte do pai. Do prólogo, quando são apresentados os personagens, até o final, inflado de adoçamento de atitudes e descobertas de afetividade, abre-se espaço para que o público se comova com o encontro fraternal. A trama é conduzida com dosagem aplicada com domínio do tempo dramático, de maneira a que se perceba e compreenda as firulas da ação. Traços cuidadosos para narrativa infalível, comunicativa e com ganchos suficientes para prender o espectador. O diretor José Wilker imprime agilidade à narrativa para fazê-la nervosa, movimentada, voltada para os estímulos, mais do que para a reflexão. Ainda que a movimentação cenográfica pelos atores emperre a intensidade geral, Rain Man não descuida de capturar a atenção do público, mesmo com ambientação emocional menos adensada. De certa maneira, a assistência reage de forma distendida, tal como o diretor conduziu a montagem. As interpretações apontam neste sentido. Rafael Infante  mantém o tom leve e solto por entre as transformações por que passa o personagem. Fernanda Paes Leme também não demonstra muitas variações na sua atuação. Marcelo Serrado, em composição verdadeiramente construída, provoca efeito inverso na percepção da realidade existencial do autista. O público ri a cada uma das suas intervenções.       

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domingo, 7 de julho de 2013

24ª Semana da Temporada 2013


Quatro Autores à Procura da Identidade

Crítica/ Garras Curvas e um Canto Sedutor
Fios e tessituras desencapadas de um novelo narrativo
Daniele Avila Small captura em Garras Curvas e um Canto Sedutor ecos literários que oscilam entre Raymond Carver e Edgard Allan Poe, perseguindo originalidade dramática que estabeleça autonomia narrativa. De Carver, a autora retirou o esboço da trama, enquanto de Poe, a leitura transposta de um dos seus poemas, como se do amálgama das duas fontes retirasse seiva fertilizadora para expressão autoral. A chegada de um homem cego, que diante de um casal – ele, incomodamente instalado em um cotidiano que o acua; ela, enfrentando as tensões de se descobrir – provoca em cada um, de forma enigmática e iluminadora, revelações sobre obscuros objetos dos desejos, ou da falta deles. A princípio, de maneira comum, em seguida, em progressão bem construída, o texto cria envolvência pendular, entre algum mistério e certa aura literária. A montagem dirigida por Felipe Vidal se apropria, parcialmente, do exíguo espaço do Porão da Laura Alvim, menos como solução cenográfica, e mais como distância do adensamento intimista. Mesmo com interpretações cuidadosamente integradas a um ritmo ralentado, Vidal sugere alguma hesitação em investir na densidade de atuações mais abstratas, sem tantas conotações concretas. Ainda que desejasse acentuar o contraponto (real e ficcional), a direção desata e instiga aquém dos emaranhados fios e tessituras do novelo do texto. Leandro Daniel Colombo se mostra mais à vontade nas hesitações iniciais do personagem do que na conversa com o hóspede cego. Ângela Câmara expõe, em parte, as dualidades da anfitriã. Rafael Sieg, com firme e modulada voz, se aproxima do aspecto sedutor das intervenções do cego.

     
Crítica/ Os Sapos
 
A descarga elétrica das relações de afeto
Renata Mizrahi, autora desta texto realista em cartaz no Galpão de Artes do Espaço Tom Jobim, desenvolve através de um casal, isolado em uma casa de campo, as contradições emocionais que se revelam quando da chegada de inesperada visitante que deflagra latentes disfunções. Ao casal morador, junta-se um casal vizinho, que também é atingido por essa hóspede, que cobra, metaforicamente, as diárias afetivas que cada um deles paga aos pares. Com um diálogo afiado e natural (os personagens falam com a fluência do coloquial), a ação vai revelando o subterrâneo de relações contraditórias, emocionalmente inconclusas, cuja agente é esta visitante que desencapa o fio que leva à descarga elétrica. Os sapos do título são referências aos intrusos anfíbios que aparecem, inoportunamente em cômodos da casa, tal como a mulher que chega para desarrumar a aparente ordem. Mizrahi domina nesta narrativa a escrita dramática, ao mesmo tempo em que demonstra segurança no desenvolvimento de uma trama realista. A direção da autora e de Priscila Vidca apoia, decisivamente, o caráter realista da cena, não só no cenário campestre de Nello Marrese e Lorena Lima, como na linha interpretativa do elenco. A quebra que se estabelece com a presença permanente dos atores no espaço da representação – ficam sentados nas laterais, à espera de entrar em cena – contribui para que a naturalidade dos diálogos ganhe revigorada espontaneidade. Gisela Castro, intensa, Verônica Reis, difusa, Paula Sandroni, rígida, Ricardo Gonçalves, solto, e Peter Boos, arrebatado, compõem quadro à serviço de uma montagem que pretende não ir muito além de contar bem uma história.       

Crítica/ As Horas Entre Nós
Desajuste do tempo que separa intimismo de política
Joelson Gusson, que assina a direção e adaptação do romance Mrs. Dalloway, de Virginia Woolf, em cartaz no Teatro Glaucio Gill, foi de certa maneira ousado nesta transposição para o palco. Afinal, transfere para o Brasil do período da ditadura e para a crise política e a fricção social dos anos 70 a ação de uma narrativa, profundamente intimista, de sentimentos sutis, submersos em ambiente psicológico. A estrutura do romance condensa em um único dia uma festa o que a memória de grupo de amigos traz de outro tempo, o da convivência da juventude. Sentimentos que envolvem o que se é hoje, o que se quis no passado, que julgamento se faz do que se viveu e ao que existência os conduz, perpassam a narrativa de Virginia Woolf, construindo universo descompassos e incontornáveis dependências. A adaptação se distancia desta atmosfera, sem alcançar autonomia da ambientação sócio-política. Há uma superposição de  escalas narrativas, que retiram do original sua característica e enfraquecendo o caráter próprio        do que lhe foi imposto. Não se trata de uma questão de fidelidade, mas de desajuste desta cenarização, que acaba por se restringir, tão somente, ao empréstimo da trama original. Esse descompasso pode ser constatado quando o personagem Septimus, que é bastante bem delineado na sua esquizofrenia existencial, recorre à leitura do livro para se tornar menos dissociado da volubilidade dos demais papéis reescritos pelo adaptador. Na direção, Joelson Gusson foi pouco além da ideia da sua cenografia, que ao utilizar a circularidade de um grande sofá, parece ter se acomodado à solução das passagens de tempo. A falta de atmosfera, a original e a imposta, deixa ainda mais à mostra as fraturas da postiça transposição. Os atores – Carolina Ferman, Cristina Flores, Cris Larin, Joelson Gusson, Leonardo Corajo e Lucas Gouvêa – refletem em suas interpretações as dissonantes e vagas proposições trazidas pela adaptação.    

Crítica/ Como Nossos Pais
Fotografia editada dos conflitos de pai e filho 
Pedro Neschling é o autor, ator e diretor desta montagem em cartaz no Centro Cultural da Justiça Federal, demonstrando domínio em texto com registro realista, com toques melodramáticos e sociais. A trama fotografa a relação de um pai, de origem humildade e que se transforma em poderoso empresário, com o filho carente de atenção. A presença de uma namorada e do filho de uma antiga empregada interfere no jogo de afetos entre pai e filho, em que o papel de ambos  contribui para impulsionar a ação. É uma narrativa escorreita, bem roteirizada, seguindo padrão de escrita que não esconde a lembrança de seriados de televisão e o cuidado de não ultrapassar certos parâmetros dramáticos. Manter-se dentro de algumas convenções, restringe o texto ao bom mocismo e a acomodação do final, além de enfraquecer a agilidade dos diálogos. Na direção, Neschling buscou imprimir dinâmica às cenas curtas, quase quadros, que compõem imagens editadas para um veículo visual. A cenografia de Flavio Graff acentua o aspecto de corte, restringindo ao meio corpo a figura dos atores em cena, como se os totens iluminados que se distribuem pelo palco, definissem e buscassem closes. Isio Ghelman, como o pai, revela mais afinidade com o confessional das revelações da primeira cena, do que na mudança pela qual o personagem atravessa. Pedro Neschling, como o filho, apesar de ser o autor e, portanto ter intimidade com a sua criatura, tem interpretação apagada. Fabrício Santiago compõe, tanto física como emocionalmente, as contradições das injustas relações sociais. Vitória Frate não supera com empenho e beleza a relativa inexpressividade da personagem da patricinha.     
     
                                                          macksenr@gmail.com

quarta-feira, 3 de julho de 2013

Prêmio Cesgranrio


Finalistas do 1ª Semestre da Temporada 2013 
As Mulheres de Grey Gardens: indicações de atriz, luz e cenografia
Foram selecionados os finalistas do primeiro semestre da primeira edição do Prêmio Cesgranrio de Teatro com algumas novidades, como a inclusão de categorias voltadas para os musicais e a indicação de três nomes por categoria.

Diretor: Sergio Módena (A Arte da Comédia)
             Walter Lima Jr. (Repetition)
              Charles Moeller (Como Vencer na Vida Sem Fazer Força)

Ator: Ricardo Blat (A Arte da Comédia)
         Thelmo Fernandes (A Arte da Comédia)

Atriz: Camila Amado (O Lugar Escuro)
          Ana Kfouri (Moi Lui)
          Clarice Derzie Luz (À Beira do Abismo me Cresceram Asas)

Cenografia: Bia Junqueira (As Mulheres de Grey Gardens)
                    Rui Cortez (Moi Lui)
                     Rogério Falcão (Como Vencer na Vida Sem Fazer Força)

Iluminação: Tomás Ribas (Moi Lui)
                     Renato Machado (Vestido de Noiva)
                      Luiz Paulo Neném (As Mulheres de Grey Gardens)

Figurino: Tanara Schornadie (Rock in Rio)
                Marcelo Pies (Como Vencer na Vida Sem Fazer Força)
                 Rita Murtinho (Emily)

Autor: Julia Spadaccini (Aos Domingos)
            Rodrigo Nogueira (O Teatro É Uma Mulher)

Direção Musical: Délia Fischer (Rock in Rio)
                            João Bittencourt (Na Bagunça do seu Coração)
                             Paulo Nogueira (Como Vencer na Vida Sem Fazer Força)

Ator em Musical: Ícaro Silva (Rock in Rio)
                            André Loddi (Como Vencer na Vida Sem Fazer Força)
                             Gregório Duvivier (Como Vencer na Vida Sem Fazer Força)

Atriz em Musical: Adriana Garambone (Como Vencer na Vida Sem Fazer Força)
                               Suely Franco (As Mulheres de Grey Gardens)
                                Lucinha Lins (Rock in Rio)

Especial: José Dias pelo lançamento do livro Os Teatros do Rio.
                Lidia Kosovski pela curadoria da exposição A Mão Livre de Luiz Carlos Ripper

Espetáculo: A Arte da Comédia
                   Como Vencer na Vida Sem Fazer Força
                  Moi Lui