terça-feira, 16 de julho de 2013

25ª Semana da Temporada 2013


Crítica/ A Falecida
Tragédia carioca em enquadramento pictórico
Há em A Falecida, como em tantos outros textos de Nelson Rodrigues, o determinismo da personagem em mergulhar na obsessão, diante da qual a existência se transforma no percurso para realizá-la. Zulmira constrói a morte como vingança da vida, buscando a pompa no fim para justificar as emoções suburbanas de sempre. O que a cerca, no entanto, é bem mais implacável do que qualquer acerto definitivo, e como na consulta à cartomante é ludibriada por justificar a vida pela falsa permanência após a morte. O diretor Moacyr Góes condiciona a sua montagem, em cartaz no Teatro Maison de France, com a execução instrumental da marchinha Cidade Maravilhosa, que abre o espetáculo com o ator Leon Góes vestido de terno branco, rosto coberto de máscara carnavalesca, malemolente em passos de samba. Está desenhado o quadro cênico tipificado como malandro e fixado como imagem cristalizada de certa geografia humana da cidade. Essa conotação quase pictórica, acentua, de maneira niveladora, o conceito de tragédia carioca de A Falecida, subtraindo-lhe o vigor dramático. O que Zulmira se impõe como sina, destino a ser celebrado com a exposição da morte, desaparece em meio a configuração externa, mais retrato do que mergulho. O espetáculo se abriga nesta padronização carioca da malandragem, fragilizando os movimentos subterrâneos daquela que subverte comportamentos impelida pelo acúmulo de frustrações, pretendendo se redimir com o ritual da morte. O tom se desajusta, mais ainda, com o visual (cenário, adereços e figurinos) de Teca Fichinski, que reforça o aspecto jocoso e divertido imposta pela direção. As portas do cenário são parcialmente integradas à movimentação da cena, e os adereços (como o telefone e o uso de um ator como espelho) pouco criativos, além da precária utilização do alçapão. No elenco – dos disciplinados Sérgio Kauffmann, Ricardo Damasceno, Daniel Carneiro e Augusto Garcia, disciplinados – destaca-se a voz de Simone Centurione. Leon Góes, com emissão e interpretação veladas não é provocado a contracenar com Bianca Rinaldi, que permanece mecânica e passivamente linear com uma Zulmira sem viço.       

Crítica/ Rain Man
Versão adocicada de encontro fraternal 
O filme em que é baseada a versão teatral em cartaz no Teatro dos Quatro tinha, além da ótima interpretação de Dustin Hoffman, bom roteiro original,  que conduzia e conquistava com habilidade a emotividade as plateias de cinema no final dos anos 80. Na transposição para o palco, mais de duas décadas depois, as características de origem são mantidas com a igual artesania, repetindo a mesma costura na manipulação das regras de playwriting bem alinhavado. A relação de irmãos, um autista, o outro ressentido com o passado, se estabelece a partir da morte do pai. Do prólogo, quando são apresentados os personagens, até o final, inflado de adoçamento de atitudes e descobertas de afetividade, abre-se espaço para que o público se comova com o encontro fraternal. A trama é conduzida com dosagem aplicada com domínio do tempo dramático, de maneira a que se perceba e compreenda as firulas da ação. Traços cuidadosos para narrativa infalível, comunicativa e com ganchos suficientes para prender o espectador. O diretor José Wilker imprime agilidade à narrativa para fazê-la nervosa, movimentada, voltada para os estímulos, mais do que para a reflexão. Ainda que a movimentação cenográfica pelos atores emperre a intensidade geral, Rain Man não descuida de capturar a atenção do público, mesmo com ambientação emocional menos adensada. De certa maneira, a assistência reage de forma distendida, tal como o diretor conduziu a montagem. As interpretações apontam neste sentido. Rafael Infante  mantém o tom leve e solto por entre as transformações por que passa o personagem. Fernanda Paes Leme também não demonstra muitas variações na sua atuação. Marcelo Serrado, em composição verdadeiramente construída, provoca efeito inverso na percepção da realidade existencial do autista. O público ri a cada uma das suas intervenções.       

                                                         macksenr@gmail.com