quarta-feira, 29 de abril de 2015

Antonio Abujamra


A cena do exercício de provocação
Antonio Abujamra exercia seu humor caustico e provocativo em programa de televisão, nas entrevistas e, invariavelmente, no teatro. É dele a irreverente denominação do jovem grupo que comandou por anos e que recebeu o incitante aposto de Os Fodidos Privilegiados. Essa marca de personagem construído e bufão verbal, que destrava preconceitos e afrontava os bem-pensantes, ofuscava sua persona artística, ele que vivenciou experiências com Roger Planchon e o Théâtre National Populaire, estagiou no Berliner Ensemble, absorvendo com seu ceticismo de inveterado jogador, teorias que viria aplicar ao longo de seis décadas de carreira. O repertório de diretor, desde os anos 1960, conjugava a valorização da dramaturgia com rupturas formais no acabamento. Circulando nas suas primeiras investidas por autores identificados politicamente, é no grupo Decisão que amplia a escolha por um teatro de intervenção social, montando Brecht e transportando para Sorocaba a “Fuenteovejuna” de Lope de Vega. Mas sempre na contramão, Abujamra encena, em plena efervescência de 1964,  O inoportuno, de Harold Pinter, então considerado um autor do absurdo e de temática alienante. E submete, em eclética fricção dos meios expressivos, o ritualismo de Sófocles, o classicismo de Lorca e Shakespeare, e a vida como ela é de Nelson Rodrigues. A montagem de “Um certo Hamlet”, que subverteria o personagem shakespeariana em 1991, dá a medida de um diretor petulante em confronto com a sacralidade do mito. Fazia questão de chocar, de provocar reações pelo exagero, sem qualquer pudor em ser vulgar até o limite da banalidade. O temperamento do frasista irremediável permitia que em suas encenações convivessem, algumas vezes em ultrajante humor, o profano e o perverso, para não deixar qualquer dúvida na plateia de quem ou contra o que estava sugerindo repulsa ou adesão. Em 1987, retomou sua carreira de ator no teatro no solo “O contrabaixo”, que permaneceu anos em cartaz, e que se transformaria em “cavalo de batalha” de um intérprete de humor inteligente, que impulsionava o personagem, fora e dentro de cena.