Crítica do
Segundo Caderno de O Globo (2/8/2015)
Crítica/ “Ivon
Curi – O ator da canção”
Irrelevâncias biográficas em musical stand-up |
“Ivon Curi – O ator da canção” sintetiza de modo
exponencial os problemas da insistência na fórmula exaurida dos musicais
biográficos. Da escolha do personagem, com história rala, à narrativa, com
apelos à comédia em pé, o autor Pedro Murad procura disfarçar a ausência de
dramaturgia com alguma originalidade, escondendo a sucessão sem ritmo dos
quadros em ambiente absurdo. O cantor, que na fase descendente da carreira
manteve casa de show de samba e mulatas, reaparece nos escombros da boate ao
lado do pianista na Copacabana do ano 2050. Não era preciso avançar tanto para ilustrar
a vida de cantor da década de 1950 para apenas se restringir a detalhes como
sua imagem afetada e o número de irmãos, irrelevâncias para introduzir, de maneira pálida, o seu
repertório musical. A despreocupação em traçar com alguma veracidade o perfil
de Ivon, certamente frustra a geração que o ouviu na Rádio Nacional e o
assistiu em filmes da Atlântida. Para os demais, fica a impressão de que foi um
intérprete de xotes engraçadinhos, canções melodramáticas e de versões de hit franceses, e quase nada mais. Talvez ambos tenham razão, já que o
material biográfico tal como é tratado por Murad, demonstra ser pouco permeável à exposição
teatral. Sem um tratamento que o situe em seu tempo, dimensione suas qualidades
musicais e crie situações dramáticas, que não apenas desarrumem a cronologia
factual, seria possível deixar o espetáculo com pergunta bem diferente daquela
que assalta o espectador à saída. “Por que montar mais um musical sobre vida tão
inexpressiva?” Também fica sem resposta a dúvida do porquê da direção dividida por
Lucio Mauro Filho e Danilo Watanabe. O resultado cênico não justifica a
duplicação. A confusa e atropelada narrativa se alonga, perdida em desvios e
divagações, pontos fatais para o gênero, restando aos diretores aproveitar as
habilidades de comediante de Fernando Ceylão. Para tanto, o musical é esquecido
para que se instale a stand-up comedy e o ator desça à plateia para brincar com
o público e tentar reanima-lo. Registre-se o esforço. Como o protagonista dispõe
de limitado alcance vocal, a parte musical é defendida pelo ator, cantor e
pianista Leonardo Wagner.