Crítica do
Segundo Caderno de O Globo (28/10/2015)
Crítica/ “Ou tudo
ou nada”
Na origem desta comédia musical americana estão
uma peça neozelandesa e um filme inglês que contam a mesma história com
pequenas variantes. Os operários Jerry e Dave perderam o trabalho e não sabem
como pagar a pensão do filho ou suportar a insistência da mulher por conseguir
uma ocupação remunerada. Ao descobrir o sucesso de um clube de strip-tease
masculino, decidem criar show em que pretendem “mostrar tudo”. O diferencial é
importante, afinal não têm os corpos padrão de go-go boys. Feiosos, barrigudos,
desajeitados, inexpressivos, formam, depois de seleção difícil e de impasses
familiares, grupo de strippers que alcança êxito no espetáculo que desnuda as
imperfeições. A música é parte integrante da dramaturgia, fluindo com a ação,
sem que seja necessária pausa no diálogo para que as canções possam ser
ouvidas. As características de comédia, em especial no primeiro ato, absorvem
com naturalidade a trilha musical, se integrando, organicamente, à trama. Como
o entrecho converge para a previsível cena final, não há surpresas quanto ao
desfecho, atingindo o grand finale depois
de situações de muito humor e alguma pieguice. O segundo ato acusa relativa
queda de interesse, restabelecido pela apoteótica chorus line dos sem roupa.
Tadeu Aguiar coordena com mão segura a complexidade do musical para além das exigências
técnicas. A direção sintoniza a funcionalidade do cenário de Edward Monteiro
com os tempos coreográficos de Alan Rezende, valorizando os efeitos da luz de David
H. Bosboom e Daniela Sanchez e o figurino de Ney Madeira e Dani Vidal. A
direção musical de Miguel Briamonte e a versão de Artur Xexéo completam a
sincronia dos elementos da divertida comédia com música. A intervenção de Tadeu
Aguiar se mostra mais evidente na unidade interpretativa que consegue impor ao
elenco, capaz de se desdobrar no canto e na atuação, mantendo regularidade no
fôlego e intensidade no ritmo. A preparação de Mirna Rubim não passa
despercebida na qualidade homogênea alcançada pelas vozes. Mouhamed Harfouch
tem presença catalizadora como Jerry, conduzindo a trama com seguro tempo de
comédia. Cláudio Mendes explora seu tipo físico sem qualquer recato, aliciando
a plateia com a figura bonachona de Dave. O menino Xande Valois conquista pela
malícia infantil. Kakau Gomes é uma esposa insistente e expansiva. Carlos
Arruza, o coreógrafo improvisado do grupo, joga com a sua estatura. Patrícia
França surpreende como intérprete de canções nada fáceis. André Dias, em
composição assumidamente caricatural, encontra o tom do atrapalhado suicida.
Sérgio Menezes é a voz mais poderosa do elenco. Victor Maia, o acrobata trapalhão,
demonstra maleabilidade corporal. Sylvia Massari construiu, vocal e
corporalmente, a pianista ensaiadora senil com impagável comunicabilidade. Os
atores em papéis menores – Samantha Caracante, Felipe Niemeyer, Fábio
Bianchini, Gabriel Pelegrino, Carol Futuro, Sara Marques, Larissa Landim,
Raphael Alonso e Christiane Mattos – se enquadram no harmoniosa coletivo.