Crítica do
Segundo Caderno de O Globo (19/1/2014
Crítica/ Todos os
Musicais de Chico Buarque em 90 Minutos
O título do espetáculo não indica de que modo
serão revividos os musicais de Chico Buarque, apenas determina o tempo de
duração, afinal desmentido pela prorrogação em muitos minutos. Charles Möeller,
que assina a concepção e direção, e Claudio Botelho, o roteiro e direção
musical, procuraram desviar-se do recital e da temática expositiva do
repertório, escolhendo a alternativa de criar um filete de história que
introduz cada grupo de canções. O percurso mostra ser um atalho, que se afasta
do eixo poético das letras, sem alcançar a autonomia da sua origem dramática. A
trupe mambembe que sai em improvável turnê para montar “A Dama das Camélias”
não resiste à evidência de mero e frágil pretexto para a distribuição em
módulos da sequência de canções. Como há situações a enquadrar as músicas, seja
numa praça de interior ou na representação da hemoptise de Marguerite, o elenco
é levado a interpretar enquanto canta, buscando musicalidade na atuação teatral.
Sem as características de vários formatos, atualmente tão em voga no gênero,
este musical faz apenas tímidas tentativas de seguir algumas regras. Abandonando
a coreografia, substituindo-a por movimentos a fechar em ciranda, o diretor
brinca com a sonoridade de “Geni e o Zepelin”, usando placas manuseadas pelos
atores, e ilustra com refletores a dramaticidade de “ Pedaço de mim”. Mas os
melhores traços da montagem e sua oculta força cênica podem ser encontrados na
dramaturgia musical da própria obra de Chico Buarque. É quando valoriza a
qualidade de letra e música, o dramático e irônico de alguns versos e o
engajamento da palavra poética que o musical com o selo Möeller & Botelho encontra
o equilíbrio. O discutível figurino Marcelo Pies e o severo cenário de Rogério
Falcão não comprometem a excelência da direção musical de Claudio Botelho e da
orquestração e arranjos de Thiago Trajano. Com extrema sensibilidade para cada
tema, a dupla, ao lado dos músicos – Thiago Trajano, Luciano Azevedo, Priscilla
Azevedo e Marcio Romano - reinterpreta com
sofisticados acordes canções bastante conhecidas. O elenco de vozes apuradas
alcança unidade vocal que não encobre as qualidades individuais. Malu Rodrigues
alia a sua figura diáfana à delicadeza das interpretações. Lilian Valeska tem
em “Funeral de um lavrador” o mais intenso entre os seus bons momentos. Renata
Celidonio e Estrela Blanco se destacam pela técnica, enquanto Felipe Tavolaro pelo
poder vocal. Davi Guilherme, um ótimo cantor, concede um pouco ao histrionismo.
Soraya Ravenle é um nome fixado na história dos musicais cariocas. Claudio
Botelho, como narrador e sem a pretensão de cantar, destoa de quadro tão
harmônico.