quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

Temporada 2014

 Crítica do Segundo Caderno de O Globo (22/1/2014)

Crítica/ Callas
Retrato sem projeção de uma diva

Fernando Duarte, autor de “Callas” deixa evidente a sua admiração pela soprano, endeusada por melômanos e cultuada pelo temperamento de diva. O esboço dramático, que traça entre a cantora e o curador da exposição de figurinos usados em óperas pelo mundo, propõe-se como pretexto para estabelecer acúmulo de informações sobre as fragilidades da mulher frente ao mito. Nos diálogos entre o fã e a estrela são repassados os momentos de crise amorosa, rejeição afetiva, competição e declínio da carreira, distribuindo os dados biográficos por perguntas protocolares , tendo sempre divagações como respostas. Para reafirmar algumas passagens de vida, frases mais candentes são projetadas no cenário, complementando imagens de participação de Maria Callas em óperas, al mare com Onassis e outras tantas apoteoses consagradores, em registro factual que contracena ilustrativamente com a narrativa. Duarte situa essa recolha de fragmentos pessoais, no dia que antecede a morte de Callas, como para reviver a cronologia das lembranças. Sem tensão e modulações, o texto avança em pequenos monólogos em série, reduzindo a dimensão da personagem a revelação fotográfica de uma pesquisa. O cenário de Rafael Guedes se mostra mais como projeto para acomodar as projeções, do que propriamente como solução cênica. O figurino de Sonia Soares recria modelos originais com qualidade de confecção. Marília Pêra na direção parece evocar um certo tradicionalismo, ao imprimir ao casal de intérpretes impostação rígida, pausas alongadas e gesticulação eloquente. A diretora, talvez, tenha adotado essa linha em função da visível inexperiência do elenco, demonstrada na dificuldade de desenhar os movimentos  e encontrar nuances. As tentativas de dar corpo às vozes, como nas mudanças de trajes, na gargalhada sugerida, no  silêncio prolongado entre frases e nos gestos esboçados, se perdem pela insegurança dos atores em percorrer, sem revelar o esforço construtivo,  cada uma das suas intervenções. Cássio Reis assume o papel de escada, tornando ainda mais secundária a figura do curador. Silvia Pfeiffer se conduz com obediência mecânica às propostas da direção.