quarta-feira, 23 de setembro de 2015

Temporada 2015

 Crítica do Segundo Caderno de O Globo (23/9/2015)

Crítica/ “Andança – Beth Carvalho, o musical”
Três tempos de um repertório biografado 

Ao escrever um musical sobre Beth Carvalho, o autor Rômulo Rodrigues reverenciou a carreira e, secundariamente, a vida da garota nascida na Zona Sul e que se tornaria referência do samba do subúrbio. O caráter biográfico se confunde com a homenagem, formato encontrado para reviver a trajetória da cantora que, em plena atividade profissional, foi a maior fonte da pesquisa. O roteiro não se desvia da cronologia factual, iniciada nas aulas de balé da infância e concluída na alegria da superação. Sem maior detalhamento e comentários, são repassados acontecimentos familiares, casamentos, política, numa sucessão expositiva que é insuficiente para relacionar o ambiente musical da época e valorizar a discografia. As informações seguem a rigidez da linha do tempo, em que as variantes estariam na apresentação do repertório, ponto central na padronização de quadros em alternância de ação e canto. Invariável em quase três horas de duração, a narrativa está ajustada à seleção musical com a previsibilidade do registro disciplinado de cinco décadas de participações em festivais, lançamentos de compositores e produção de discos. A tentativa de quebra desta uniformização, já bastante explorada em musicais do mesmo gênero, fica restrita à caricaturada fã, que ao telefone com uma amiga obtusa, acompanha a evolução e o sucesso da intérprete de “Vou festejar”. Mesmo esse recurso, popularesco e desgastado, se perde no fôlego curto de insuflar vivacidade a uma dramaturgia engessada. O diretor Ernesto Piccolo administra com desenho coreográfico a partitura binária de cenas curtas e músicas longas, buscando manter a fluidez entre ambas. Nem sempre consegue harmonizar o texto de tom único ao ritmo da música. O diretor reforça o entra e sai de quadros apenas como introdução à sonoridade, que ganha destaque pela efusão que provoca como memória da sambista. A direção musical de Rildo Hora, responsável pelos discos mais destacados de Beth Carvalho, mantém a solidez do melhor de uma parceria, e garante a qualidade do conjunto de músicos. A cenografia de Clívia Cohen é responsável pela funcionalidade das mudanças de cenas, e a iluminação de Djalma Amaral pela luminosidade feérica, que sugere a de um show. O figurino de Dani Vidal e Ney Madeira acompanha as variações do modo de vestir em 50 anos. O elenco de 23 atores, com equilibrada direção vocal de Pedro Lima, se desdobra em múltiplos papéis, na maior parte,  tipos aparentados a figuras conhecidas. Beth Carvalho é interpretada por três atrizes em idades diferentes. Jamilly Mariano revela a ingenuidade da menina. Stephanie Serrat a jovem em início de carreira, e Eduarda Fadini, a mulher na maturidade. Das três, Eduarda Fadini é quem melhor se aproxima, vocalmente e como intérprete, da recriação da personagem real. Ana Berttines, como a fã, não tem receio de extrapolar os limites do humor direto, com infalível efeito na comunicação com a plateia.