Crítica do Segundo Caderno de O Globo (20/5/2015)
Crítica/ A
Atriz
A produção de A
Atriz passou por problemas até a estréia, com elenco e direção parcialmente
modificados. É evidente que esses percalços interferiram no resultado final,
pela necessidade de ajustar e adaptar a nova equipe à estrutura anterior. As
ressalvas ficam por conta do pouco tempo para ensaios e pela bravura de levar
ao público uma montagem marcada pela tensão de tantas urgências. Mas à platéia,
que desconheça esses antecedentes, e não é suposto conhecê-los, é oferecido um
espetáculo que antes de refletir os problemas, demonstra desajustes de tempo e
de avaliação artística. A começar pelo texto de Peter Quilter, que ao pretender
exaltar o estrelismo de atrizes das primeiras décadas do século passado, e de
servir de veículo para que a intérprete brilhe, mimetizando o personagem,
revela apenas o anacronismo de um universo cênico que ficou no passado. Nem
mesmo como registro nostálgico e retrato histórico de um certo ambiente
teatral, a narrativa sobrevive a este acúmulo de clichês e de repetição de
códigos desgastados. A atriz do titulo, que no seu florido camarim, se prepara
para entrar em cena, na sua última aparição antes de abandonar a carreira, é
atendida por camareira, mais ou menos fiel, e cortejada pelo ex-marido, por
quem ainda é apaixonada. O futuro marido, outro dos visitantes, é um senhor
senil, o filho, um mistério de sentimentos, o empresário, ambicioso, e o
diretor, uma figura ridicularizada. Entre as conversas de bastidor, amores
reatados, figuras cômicas do velho teatro, a atriz sobe ao palco para o ato
final, numa consagradora apresentação de texto respeitável. O circuito teatral
se completa, mas o viço de uma real construção cênica já foi perdida de saída.
Com texto tão pouco estimulante, a diretora Bibi Ferreira, e em seguida Susana
Garcia, reforçam convenções envelhecidas, respeitando, excessivamente, rubricas
que, talvez, admitissem opção mais critica. O cenário de José Dias, não só
resolve a difícil mudança de ambientes, como consegue um ar retrô para o
camarim. O figurino de Sônia Soares, rico em detalhes e cuidadoso na execução,
recria roupas de época. Stella Freitas cumpre com linearidade a função de
camareira. Giuseppe Oristano desempenha o papel de galã maduro como o
ex-marido. Bemvindo Sequeira evoca os velhinhos gagás das ”cortinas” (números
de platéia) das revistas da Praça Tiradentes. Pedro Gracindo se mantém tão
apagado quanto a falta de presença do filho. Cacau Hygino procura valorizar,
pelo exagero, a participação secundária do empresário. Gabriel Gracindo não
encontra uma linha de atuação que possa justificar o caricatural diretor. Betty
Faria, concentrada em emitir o texto e seguir as marcas, não deixa espaço para
que o glamour e o estrelismo apareçam, afinal é deste gênero de atuação que se
pretende explorar com a montagem. A atriz, para quem convergem todas as
atenções, não ocupa o lugar de “primeiro papel”, como se dizia nos espetáculos
do início do século 20.