Dois
espetáculos soltam vozes solitárias
Crítica/ Retratos
Falantes
Um filho nas franjas de um verdadeiro afeto |
Nos dois monólogos (Fritas com Açúcar e Brincando
com Sanduíche) do autor inglês Alan Bennett, que o diretor Eduardo
Tolentino do grupo Tapa traz ao Espaço Sesc, ressoam as vozes da Inglaterra
entre os resquícios das tradições emboloradas e o esfacelamento dos costumes
imperiais, soterrados por personagens nas franjas de relações doentias. Enquanto
no primeiro, o contato de um filho, emocionalmente fraco, com a mãe, na vizinhança
da insanidade, desnuda as impossibilidades de um real afeto, no segundo, um
homem vive perigosa compulsão. No limiar de suas obsessões, num mundo com o
qual não conseguem conviver, personagens revelam comportamentos periféricos
diante de suas próprias histórias. Com rigor e critério, marcas das encenações
de Tolentino, Retratos Falantes segue
a linha do diretor com os atores como centro da cena e a parte técnica
(iluminação, figurino, cenário) em papel de discreta e eficiente intervenção. Brian
Penido Ross, numa composição estruturada através de corpo e voz em desenhos bem
acentuados, alcança bons momentos como o filho conflituado, projetando, em
parte, as tensões do personagem. Zécarlos Machado enfrenta a dificuldade de
construir a complexidade de quem convive com desejos sombrios. Apesar da
intensidade dosada que o ator imprime à sua interpretação, é prejudicado pela
fragmentação e excessos de como o texto conduz o mistério do que necessário desvendar.
Crítica/ Anônimas
A ideia dessa coletânea de depoimentos femininos
é a de fazer parecer espontâneos e realisticamente naturais, confissões de
mulheres sob os mais variados temas. Dispostas em semicírculo no espaço do
Teatro do Jockey, 22 atrizes entre idades que variam dos 22 aos 60 anos,
procuram dar veracidade a histórias que o espectador não fica a saber se são
reais, fruto de vivências, recriações de experiências ou pura ficção. Sob esta
perspectiva, a reunião de tantas e variadas narrativas poderia se tornar
interessante pelo intrigante jogo de verdade e mentira que embutiria o alinhamento
teatral. Não é o que acontece. Presenças tão díspares e o pouco convencimento
de cada participação deixam a impressão de que o grupo heterogêneo se relaciona
apenas sequencialmente, narrando casos pessoais, mais ou menos interessantes,
aos quais faltam sinceridade e vigor ficcional. Por outro lado, o diretor
Roberto Naar não se esforça por dar tratamento cênico a material meramente
expositivo, sem qualquer preocupação em criar dramaturgia cênica que o
entrelace, reduzindo-o a vozes sem dissonâncias e nenhum feixe de reflexão que
ilumine de humanidade universo tão fértil. Naar demonstra a vontade de
permanecer na superficialidade, distante de pensar sobre o que as mulheres têm
a dizer. As atrizes, que alternam seus monólogos (não há diálogos ou
contracena) se esforçam para retirar, ora humor, ora sentimentalismo, ora drama,
de histórias que são recebidas pelo espectador como um quadro esmaecido sem pano
de fundo que o enquadre.