sexta-feira, 5 de setembro de 2014

Temporada 2014

Dois espetáculos soltam vozes solitárias

Crítica/ Retratos Falantes
Um filho nas franjas de um verdadeiro afeto
Nos dois monólogos (Fritas com Açúcar e Brincando com Sanduíche) do autor inglês Alan Bennett, que o diretor Eduardo Tolentino do grupo Tapa traz ao Espaço Sesc, ressoam as vozes da Inglaterra entre os resquícios das tradições emboloradas e o esfacelamento dos costumes imperiais, soterrados por personagens nas franjas de relações doentias. Enquanto no primeiro, o contato de um filho, emocionalmente fraco, com a mãe, na vizinhança da insanidade, desnuda as impossibilidades de um real afeto, no segundo, um homem vive perigosa compulsão. No limiar de suas obsessões, num mundo com o qual não conseguem conviver, personagens revelam comportamentos periféricos diante de suas próprias histórias. Com rigor e critério, marcas das encenações de Tolentino, Retratos Falantes segue a linha do diretor com os atores como centro da cena e a parte técnica (iluminação, figurino, cenário) em papel de discreta e eficiente intervenção. Brian Penido Ross, numa composição estruturada através de corpo e voz em desenhos bem acentuados, alcança bons momentos como o filho conflituado, projetando, em parte, as tensões do personagem. Zécarlos Machado enfrenta a dificuldade de construir a complexidade de quem convive com desejos sombrios. Apesar da intensidade dosada que o ator imprime à sua interpretação, é prejudicado pela fragmentação e excessos de como o texto conduz o mistério do que  necessário desvendar.    

Crítica/ Anônimas
Coletânea superficial de casos femininos

A ideia dessa coletânea de depoimentos femininos é a de fazer parecer espontâneos e realisticamente naturais, confissões de mulheres sob os mais variados temas. Dispostas em semicírculo no espaço do Teatro do Jockey, 22 atrizes entre idades que variam dos 22 aos 60 anos, procuram dar veracidade a histórias que o espectador não fica a saber se são reais, fruto de vivências, recriações de experiências ou pura ficção. Sob esta perspectiva, a reunião de tantas e variadas narrativas poderia se tornar interessante pelo intrigante jogo de verdade e mentira que embutiria o alinhamento teatral. Não é o que acontece. Presenças tão díspares e o pouco convencimento de cada participação deixam a impressão de que o grupo heterogêneo se relaciona apenas sequencialmente, narrando casos pessoais, mais ou menos interessantes, aos quais faltam sinceridade e vigor ficcional. Por outro lado, o diretor Roberto Naar não se esforça por dar tratamento cênico a material meramente expositivo, sem qualquer preocupação em criar dramaturgia cênica que o entrelace, reduzindo-o a vozes sem dissonâncias e nenhum feixe de reflexão que ilumine de humanidade universo tão fértil. Naar demonstra a vontade de permanecer na superficialidade, distante de pensar sobre o que as mulheres têm a dizer. As atrizes, que alternam seus monólogos (não há diálogos ou contracena) se esforçam para retirar, ora humor, ora sentimentalismo, ora drama, de histórias que são recebidas pelo espectador como um quadro esmaecido sem pano de fundo que o enquadre.