quinta-feira, 13 de março de 2014

Temporada 2014

Crítica do Segundo Caderno de O Globo (12/3/2014)

Crítica/  A Toca do Coelho
A conivência familiar diante do luto


Textos com esse do desconhecido americano David Lindsay Abaire, sancionado por um generoso Prêmio Pulitzer, parecem querer provocar a emoção da plateia, buscando em doses controladas de drama e humor não arranhar sensibilidades vulneráveis a melodramas. Oito meses depois da morte do filho de cinco anos, casal vive o luto, confrontado com a anunciada gravidez da irmã e as lembranças dolorosas da mãe de Rebeca e com as tentativas escapistas de Paulo em recompor a vida. Um quinto personagem, o adolescente responsável pelo atropelamento do garoto, gravita em torno da narrativa como alguém capaz de redimir a continuidade da vida. A construção da situação central, que vai se revelando através da participação dos outros personagens, é urdida segundo manual do realismo psicológico, em que nada deve estar fora do lugar, a trama precisa ter coerência, e a ação evoluir com carga sentimental. “A toca do coelho” segue as regras, acrescentando-lhes quebras de tensão para suavizar o clima trágico e sugerir eventual lágrima furtiva. A montagem de Dan Stulbach procura o equilíbrio entre amenizar e emocionar a curva dramática, mas a exemplo do autor não projeta a subjetividade da perda e não escapa da vizinhança ao melodramático. O cenário de André Cortez, projetado para palco bem maior, foi transposto para o espaço exíguo do Teatro Leblon, restringindo sua funcionalidade, já que as projeções, que são parte integrantes da concepção, se tornam apenas traços abstratos em movimento. No elenco, Felipe Hintze tira bom partido da sua juventude e do tipo físico para dar a dimensão humana ao perplexo adolescente atropelador. Simone Zucato, a grávida cheia de atitude e um tanto fora de lugar no sofrimento do casal, impõe-se à personagem no limite da implosão. Selma Egrei tem dificuldades em dosar o destempero verbal da mãe, com as ponderações afetivas para a filha. Reynaldo Gianecchini imprime dramaticidade arrebatada que afasta sua interpretação das reações interiores do pai. Maria Fernanda Cândido é quem demonstra, pela contenção de gestos, pausas medidas e máscara suavemente entristecida, maior proximidade com os sentimentos da mãe enlutada.