sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

48° Semana da Temporada 2011


Marcelo Rubens Paiva; Diretor e Autor

Crítica/ Deus É Um DJ
Som e imagem fluídas numa fúria de sensações 
Os dois personagens deste texto do alemão Falk Richter são um DJ e uma VJ, que confinados num espaço fechado, onde se submetem ao espetáculo de um reality show, desempenham os papéis que os ritos de suas atividades lhes confere. Apoiados por trilha sonora da época em que a peça foi escrita (final dos anos 90), e por imagens que sublinham grafismo do mesmo período, o casal se pretende representação da década da convergência de uma certa estética com a tecnologia, do esvaziamento de conteúdos e da avalanche, por várias vias, do fluxo de informação que atropela a construção dos discursos. O flagrante da emergência de fenômeno que se acirra e que se vive cada vez com mais intensidade, se reflete na narrativa de Richteter e tem o seu melhor ponto de inflexão teatral na fixação dos elementos de  cultura sustentada pela contemporaneidade. Mas a narrativa se fragiliza, exatamente, pelo caráter de atualidade. O tempo deixou marcas no texto na citação de tecnologia e comportamentos desgastados pela urgência e ritmo com que os códigos são convertidos continuamente. A estrutura é irregular e apenas a interseção de música e imagem não é suficiente para criar identidade dramatúrgica, que atingiria maior abrangência se construída a partir dos próprios registros das linguagens dos DJs e dos VJs. Não por acaso, os monólogos iniciais de cada um dos personagens – ele, falando de viagem pelo deserto: ela, contando a experiência num programa banal de televisão – reproduzem com acuidade o espaço vivencial das suas atuação profissional, capturando seus códigos e universo musical e imagético. DJ e VJ expõem a natureza do som e imagem que produzem. Ecoam a fúria das sensações fluídas de uma geração na sua maneira de estar, perceber e expressar o seu tempo. Esta introdução se destaca, decisivamente, do restante.O diretor Marcelo Rubens Paiva poderá até ter percebido a desestruturação do texto, tanto que conduz a montagem com excesso de informalidade, buscando explicar, mais do que situar o que está acontecendo na cena. Mas o mundo que se pretende mostrar, não aparece, camuflado na sequência de quadros banais (o pior deles, o da aula de culinária), e sem projetar o que provoca os acordes e os traços de intenso ruído cultural. A concepção cenográfica não colabora muito para que se estabeleça a ambientação dramática de um  show de realidade. Tanto Maria Ribeiro quanto Marco Damigo estão bastante à vontade nesta linha mais informal, buscando intimidade com a platéia. Nas cenas iniciais, a dupla tem desempenho na medida, com ótimos momentos. Nas demais se perdem, perseguindo cumplicidades.


Crítica/ C’Est La Vie
Hesitação entre o nonsense e o humor agridoce 
Há quase uma indicação de reportagem, numa primeira impressão, na escrita de Marcelo Rubens Paiva nesta narrativa que se utiliza da história de mulher solitária que liga para o serviço do disque-denúncia. Os telefonemas, entre o patético e o absurdo, recebidos pela central, também um tanto patética e absurda, acabam por aproximar a mulher de um dos atendentes. Do encontro, criam-se laços desatados, como as existências desses personagens desgarrados. Mas o que poderia ser impulso de repórter do autor, revela-se desvio do mote inicial. Sem muita realidade, a não ser a da solidão urbana e do telemarketing emocional, o entrecho se reduz a observações sem muita sustentação de rotineira comédia. O desenvolvimento da trama vai se definhando e mostrando a sua inconsistência, atingindo, sem que seja, aparentemente, o seu propósito, os limites do nonsense. Gilberto Gawronski e Luis Fernando Philbert, que assinam a direção, reforçaram essa linha de humor absurdo, deixando ainda mais expostas as fraturas do texto. A proximidade que se estabelece com a obra de Marcel Duchamps, já postiça na narrativa, se acentua na cenografia, dividida entre Gawronski e Nello Marrese. O elenco – Ester Jablonski, Adriano Garib e Zemmanuel Pinto – se conduz com hesitação em adotar o nonsense ou o tom de comédia agridoce.

                                                           macksenr@gmail.com