Crítica do Segundo
Caderno de O Globo (31/8/2016)
Crítica/ “Noites sem fim”
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Convivência aprisionada no realismo |
A dramaturgia deste texto da inglesa Chloe Moss é
resultado de pesquisa sobre ex-detentas em reinício de vida fora da prisão.
Lorraine, uma mulher madura que cometeu crime violento, foi presa e separada do
filho, quando ainda criança. Marie, uma jovem que cumpriu pena por roubo, sobrevive
mal, na quase marginalidade. Ao se reencontrarem no quitinete da garota,
desenrolam as memórias da convivência, quando reclusas, e dos laços, ou a falta
deles, quando livres. O que se estabelece entre elas, é tão fluído quanto a
ausência de perspectivas e as carências que determinam a proximidade. Com base
no realismo, seguindo indicações de plawriting
(técnica de escrita teatral), as
personagens precisam ser tão verdadeiras quanto possam ser sustentadas por diálogos
que pareçam reais e tenham dose de emoção que envolva a ação. “Noites sem fim”
tem, ainda que com uso restringido desses requisitos, a narrativa definida por
embate expositivo de mútua fragilidade. A autora procura criar alguns despistes
na trama para sugerir rumos que não serão percorridos, apontando para atitudes que
se desviam do verismo. É o que o texto tem de mais interessante, em meio ao
ameaçador tom melodramático que surge nas evocações de afetos perdidos e rejeição
generalizada. A prisão, ponto de partida do elo entre elas, não vai além de
citações, e é precariamente utilizada como referência para o recomeço fora
dela. A direção de Marco Antônio Pâmio fica restrita às rubricas, sem abrir
qualquer área de escape à sequência de cenas, que obriga ao black out para arranjos no cenário e troca
de adereços. São cortes que interrompem a realidade pretendida, sem a fixação
de passagem de tempo e de mudanças de temperatura interpretativa. O cenário de
Cássio Brasil, apesar do corte longitudinal com que ocupa o centro do palco e
configura alguma abstração ao olhar, se rende ao detalhamento do apartamento
modesto. As atrizes são inflexíveis às personagens, com interpretações fincadas
em rigidez de seus meios expressivos, que esvaziam a contracena. Angela
Figueiredo procura um tom mais dramático, que raramente encontra. Fernanda
Cunha busca distanciamento linear, provocando certa monotonia na sua atuação.