Crítica do Segundo Caderno de O Globo (18/6/2014)
Crítica/ Crazy For
You
Na oferta crescente de vários tipos de musicais,
em que as variantes oscilam entre biográficos nacionais, importados
estrangeiros e híbridos comerciais, todos parecem aproveitar o atual, e quase
sempre, bom momento da procura nas bilheterias. A frequência com que o gênero
aparece a cada temporada é bem maior do que o surgimento de espetáculos que ampliem
a constatação de que a produção local tem capacidade técnica e artística de
reproduzir os originais de fora, e de que o público já incorporou a linguagem, que
até há algum tempo, era resistente ao paladar brasileiro. Hoje, importa-se bastante,
produz-se muito, patrocina-se com generosidade e procura-se cortejar e reiterar
o interesse das plateias. “Crazy for you” tem como subtítulo, na versão de
Miguel Falabella, “um musical da Broadway para toda a família”, que indica a ingenuidade
da trama de caráter nitidamente americano, evocando ainda tom saudosista por músicas
e letras dos anos 30 assinadas por George e Ira Gershwin. Apesar da estreia em
Nova Iorque ter sido há 22 anos, a montagem já nasceu envelhecida com seu ar vintage involuntário, difícil de sobreviver
como entretenimento indistinto ou familiar. A estrutura tradicional do gênero é
reproduzida com elementos convencionais de dança, com base no sapateado e
coreografia acrobática e na narrativa apagada e inexpressiva. O que se
sustenta, indiferente à passagem do tempo e ao passadismo cênico, é a trilha
musical, com clássicos da dupla de compositores que resiste aos arrufos de
casais e aos bastidores dos ensaios de um elenco de caipiras. A transcrição
nacional segue o modelo de origem, com a adaptação em pequenos detalhes na
cenografia e figurino e na fotográfica direção. A matriz criativa predomina
sobre eventuais intervenções autônomas que a equipe nativa possa ter feito,
apesar da sua resposta correta às exigências e à regulação impostas. A direção
musical e vocal de Marconi Araújo, mesmo sem acrescentar brilho à partitura,
explora a sonoridade melódica das canções. O desenho de luz de Wagner Freire
esquenta a cena, apoiado pelos bem executados figurino de Fabio Namatame e
cenário de Duda Arruk. O diretor José Possi Neto orquestrou com precisão os movimentos
de um show de exibicionismo de mudanças de cenário, troca de roupas e de climas
luminosos. Os personagens Bobby Child (Jarbas Homem de Mello) e Polly Baker
(Claudia Raia) formam o casal central em torno do qual figuras coadjuvantes
circulam até o feliz encontro final. O elenco obedece a esta hierarquia,
ganhando algum destaque os atores Marcos Tumura e Liane Maya e a disciplina e a
segurança técnica do coro de 22 atores-cantores-bailarinos. Cláudia Raia com
voz ensaiada, mas sem alcance, se apoia na comicidade e Jarbas Homem de Mello demonstra
as suas qualidades de dançarino.