domingo, 1 de setembro de 2013

31ª Semana da Temporada 2013


Três Tons de Comédia

Crítica/ O Dia em que Raptaram o Papa
Convivência papal numa família judia
De Costumes. João Bethencourt autor desta montagem em cartaz no Teatro Clara Nunes, pode ser identificado como comediógrafo, como eram chamados pelos antigos cronistas da vida teatral das primeiras décadas do século passado os dramaturgos que tratavam os bons e maus costumes de sua época com humor, amavelmente, crítico. Nesta comédia que é desencadeada pelo que indica o título, Bethencourt  instala o Papa, que está em visita a Nova Iorque, na casa de família judia, desencadeando conflitos internacionais e domésticos em doses controladas para não ferir suscetibilidades culturais e religiosas. As características dos membros da família e a humanidade papal são sublinhadas com fortes traços que acentuam contrastes pelo humor, mantendo-se na variedade de situações que apóiam a comicidade. Nas comédias de Bethencourt, e o Papa é bastante exemplar disso, não se está perseguindo a piada e o humor circunstancial, os textos se sustentam pela sua construção formal e pela segurança com que a trama se desenrola. Atualmente, talvez, suas peças possam provocar algum estranhamento por passar ao largo do que a maioria das comédias de hoje buscam selvagemente: imeditiatismo, curta duração, entrechos semelhantes, comunicabilidade direta, estrutura formal pouco elaborada. O diretor Tadeu Aguiar parece ter percebido as exigências do nosso tempo, e tornado um tanto mais farsesco o que é comentário agridoce. Mas com esta escolha, Aguiar não se afasta da linha da comédia de costumes original, deixando à mostra a estrutura dramatúrgica, baseada na solidez do playwriting cultivada por João Bethencourt. O elenco corresponde à nervosidade que a direção imprime à ação. Com exceção dos que têm papéis menos destacados, os demais atendem ao estilo do humor. Rogério Fróes é um adorável Papa. Marcos Breda, um motorista de táxi facilmente reconhecível. Débora Olivieri, uma boa mãe judia. E Renato Rabelo, um rabino um tanto desequilibrado.     
  
Crítica/ A Importância de Ser Perfeito
Ceticismo chique sob a ótica da ambiguidade 
À Brasileira. Nada mais britânico do que o teatro de Oscar Wilde, em especial este texto, que em tradução e adaptação de Leandro Soares está em cartaz no Teatro do Planetário. Os diálogos de cáustica observação da hipocrisia social, com o toque espirituoso e irônico sobre os códigos de convivência fazem dessa envolvente comédia  uma peça de duradouro alcance. Para além do entrecho, jogo de aparências que resultam em dúbias interpretações e interpostas identidades, a narrativa está repleta de frases de efeito mordaz, carregada de witty, que embalam o ceticismo chique do autor. A atual versão, muito bem aclimatada na tradução e na manutenção do espírito de origem, o diretor Daniel Herz ousou transpô-la para universos algo afastados do original. O elenco masculino interpreta papéis femininos. A ação transcorre em nossas fronteiras, com algumas citações locais. E as referências à moral vitoriana se transfiguram em imagens descontruidas de uma farsa à brasileira. A opção do diretor é levada adiante com coerência estilística e adequação à linha adotada. A introdução da música, interpretada pelos atores, nem sempre se ajusta, pela duplicidade de funções do elenco que interfere no ritmo da encenação. O figurino de Thanara Schonardie, ainda que reforce com humor do exagero a dubiedade do sexo, tem mais uma imagem campestre de florido countryside inglês, do que um qualquer mata nacional. Os intérpretes, totalmente integrados à proposta da direção, intervêem com humor desabrido nas várias situações, mas a dupla João Pedro Zappa e George Sauma aproveita, com integral comparsaria, a oportunidade de explorar a boa comicidade na tradição popular brasileira.           

Crítica/ Vexame


Popularesca. Belo Horizonte, cidade de origem deste espetáculo que ocupa o Teatro Clara Nunes, abriga uma geração de comediantes que, a exemplo de outras praças, apostam no gênero como a sua escolha artística. É o caso de Amauri Reis, que ao lado de Luciana Bahia, recorre ao texto de Wesley Marchiori como fórmula de humor, unicamente como diversão e escapismo. O vexame, de que fala o título, são os micos que um homem doentiamente ciumento paga por desconfiar de qualquer atitude, entre elas as mais ingênuas, sempre que interpreta qualquer indício como certeza de que está sendo traído. Numa sequência de cenas, precariamente ambientadas num bar, as várias, nada originais e pouco interessantes reações do homem se repetem como se cada uma delas buscasse se confundir com uma piada. Essa perseguição contínua ao riso, esvazia inteiramente a possibilidade de se estabelecer um arcabouço narrativo que fuja do humor impressivo. A montagem dirigida pela atriz do grupo Galpão, Inês Peixoto, deixa impressão de que arrumou a casa – cenário simplificado e iluminação esforçada – para que o ator pudesse expandir mais ainda as oportunidades de, a pretexto de montar um texto, e embrulhá-lo num quase monólogo. Nesse one man show mal disfarçado, Amauri Reis domina a cena com malabarismos físicos (até escala o cenário) e muita agitação (se movimenta e fala interruptamente). A sua partner é somente escada para o show de um comediante excessivamente histriônico.

                                                     macksenr@gmail.com