Crítica/ O
Submarino
Códigos de casal numa maratona de atritos |
Na década de 80, a dupla Maria Carmen Barbosa e
Miguel Falabella investia no relacionamento de casal com um pé na comédia de
costumes e outro na piada de esquete. O
Submarino, que em nova montagem, assinada por Vitor Garcia Peralta está em cartaz no Teatro das
Artes, é um exemplar acabado desse produto tão em voga na época, e que
atualmente foi substituído pelos monólogos femininos sobre crises no casamento e
incompreensão dos homens em relação às mulheres. Nas observações sobre idas e
vindas da convivência, casal submerge na contradição de não saber viver
separado, e muito menos conviver a dois. Com diálogos ágeis que acompanham a maratona
de atritos, dosados com piadinhas sobre as desgastadas escaramuças que fazem
parte dos códigos matrimoniais, a narrativa sobrevive com pouco mais do que esse
humor dèjá vu. É possível que o texto
possa interessar a casais que decidam ir ao teatro para assistir a arrufos como
estímulos a passatempo que, eventualmente, ajude a compartilhar situações que lhes
pareçam identificáveis. Para pouco mais deste ameno convite, a montagem
reafirma a vocação do diretor argentino para o gênero. Arrumando a cena com
doméstico cuidado, Peralta acompanha com igual agilidade os diálogos, que
superam as situações circunstanciais que são apenas pretextos para comentários engraçadinhos
sobre desavenças. O cenário de Miguel Pinto Guimarães, manipulado pelos atores
para criar vários ambientes, funciona como acessório dinâmico. Luciana Braga assume
a personagem com alguma malícia e certa ingenuidade. Marcus Melhem não se
livra, inteiramente, se sua comicidade expansiva.
Crítica/ Caixa de
Phosphorus
Dupla desenrola novelo de poucos fios |
Por coincidência, no mesmo Teatro das Artes e em
horário diverso, essa narrativa de Renata Mizrahi se aproxima, com a diferença
de três décadas, de O Submarino. Lá
estão o mesmo casal, agora bem mais jovem, as mesmas idas e vindas no
relacionamento e diálogos movidos ao balanço das hesitações. A autora demonstra
pulso na condução de situações contínuas, apoiadas por falas nervosas, mas que desenrolam novelo de poucos fios. Mizrahi
não traz qualquer novidade sobre como os mais jovens estão a viver novas
relações afetivas. Restringe-se a ser um tanto mais intensa na linguagem, e não
na forma de abordar a tênue trama. O título corresponde à melhor brincadeira
que o texto propõe, e a intensidade que ganha no palco se deve à direção de
Susana Kruger. A montagem se mantém num ritmo regular, sem cair em quebras de
interesse, em parte pela interpretação movimentada do elenco, que a cada gesto e
na manipulação da cenografia, procura efeitos de comicidade. Os atores – Ivan
Mendes e Daniela Carvalho, ele com mais acabamento
do que ela – traduzem as propostas ligeiras e descompromissadas que estimulam
a relativa empatia do casalzinho.
Crítica/ Sexo,
Drogas e Rock’n’Roll
Victor Garcia Peralta, diretor deste monólogo do
americano Eric Bogosian, em cartaz no Teatro Leblon, é especialmente sensível a
conduzir um único ator no palco, a julgar pela constância com que é solicitado para
encenar tantos espetáculos do gênero. Na maioria, com atrizes, mas desta vez com
o ator Bruno Mazzeo e com texto estrangeiro. Ao lado de Bruno, Peralta fez a
adaptação dos seis esquetes do original, procurando abrasileirar as alfinetadas
que o autor distribui para o sexo, drogas e outros estímulos que se podem
resumir como rock’n’roll. Uns mais, outros menos, os esquetes retratam com
sensibilidade alguns aspectos da existência contemporânea. A versão local tende
a transformar a atmosfera crítica em comentário de humor, que pode se associar
à comicidade do stand up. E é
exatamente o que o público, que em apenas duas sessões por semana e no tardio
horário das 23h, espera encontrar. Ainda que o texto possa provocar alguma estranheza
na plateia, Mazzeo faz com que se alinhem numa mesma sintonia, ator e
espectador, pela maneira habilidosa como encampa a expectativa. Se no prólogo,
surge um intérprete mais intenso, ao longo do espetáculo, Bruno Mazzeo tipifica
os personagens, esvaziando a carga crítica do que dizem. Nessa escalada de
tipos, o ator deixa escapar o pretendido libelo
e o clímax que imagina-se ser a
função do último esquete. Nesta cena, é indisfarçável, pela surpresa e a frieza
da resposta, a frustração da plateia.
Crítica/ E Foram
Felizes para Sempre
As queixas femininas sobre os desenganos
com os homens e a disfunção afetiva provocada pelo acúmulo de desencontros é,
uma vez mais, levado ao palco como radiografia de interminável discussão. Com
texto e interpretação de Heloisa Perissé e direção de Susana Garcia, em cartaz
no Teatro Vanucci, E Foram Felizes para Sempre explora, como monólogo, o batido tema
sem pretender ultrapassar clichês e convenções de velhos e recentes congêneres inspiradores.
Pelo contrário, aposta em reforçá-los. Sob o pretexto de conferência no
lançamento de seu livro, um guia para vida a dois, a escritora desfia as crises
que viveu com o marido, revelando os fracassos sentimentais, expondo o que
perdeu pelo caminho até a penúria atual dos sentimentos. Nada além do que já se
viu, ouviu e comentou. Ao repassar de modo tão repetitivo as várias
referências, a autora parece ter se inspirada na atriz, imaginando-a a
interpretar múltiplos tipos que se adaptam ao seu temperamento cômico.
Seguem-se, então, psicanalistas alteradas, familiares bizarros e escritoras
sinceras, todas figuras surgidas na medida de Heloisa Perissé, a intérprete
ideal da autora Heloisa Perissé.
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