Musicais em
Vários Formatos
Crítica/ Jim
Walter Daguerre, autor deste
recital dramático sobre o cantor do The Doors em cartaz no Teatro Leblon,
envolve a figura de Jim Morrison no clima rock'n'roll de sua curta e
destemperada vida, projetando-o em personagem nascido no mesmo ano de sua
morte. A identidade construída por esse clone existencial, que procura reviver
a rebeldia do ídolo, recorrendo a citações de poetas cultuados por Jim,
reproduz atitudes e revive semelhanças. Numa atmosfera em que se misturam
tempos e biografias para encontrar as similitudes, Daguerre reforça a
associação das duas figuras, forçando a extensão do temperamento radicalmente
criador de Morrison à mediocridade do fã sem rebeldia e causa. A presença da
personagem feminina se reduz a projeção sem filtros de uma vida em outra,
acentuando o tom meramente biográfico que, ao que parece, foi o que o autor
pretendeu ultrapassar. Paulo de Moraes amplia encenação para o show de rock e a
exaltação musical, tratando as firulas existencialistas do texto como introdução
à poesia e à intensidade das apresentações do cantor Morrison no palco. A
iluminação de Maneco Quinderé é decisiva para essa atmosfera. A direção musical
de Ricco Vianna e a banda também têm papel preponderante no desenho da imagem
de show evocativo. Eriberto Leão mimetiza corporal e vocalmente a figura de Jim
Morrison, desempenhando com intensa força as canções e a letras da atormentada
e fugaz estrela pop.
Crítica/ Forrobodó
– Um Choro na Cidade
A burleta de Carlos Bettencourt e Luiz Peixoto,
com músicas de Chiquinha Gonzaga, direção de André Paes Leme, em cartaz no
Teatro Ginástico, teve versão em 1995 assinada pelo mesmo encenador. Há 18
anos, a adaptação de Paes Leme insuflava agradável sopro de novidade à peça
escrita em 1912, revisitando a ingenuidade matreira e a caricatura amável de
participantes de um baile popular. Nesta montagem, o diretor ambienta a trama
numa gafieira sem localizar em que momento, e sem evocar a época em que Forrobodó estreou. O figurino é a
demonstração dessa atemporalidade. Mas
ao experimentar postiça participação da plateia, convidando alguns espectadores
ao palco, revela a própria desconfiança na linha adotada de trazer a narrativa
para imprecisa roda de samba, chorinho e maxixe de fundo de quintal para a
atualidade. O elenco nem sempre projeta bem as canções, não só por limitações
vocais, como por interpretar de
maneira muito empenhada as letras. O esforço quase sempre conduz os
atores-cantores ao exagero. Com ressalvas para Marcos Sacramento, que se impõe
pela ponderosa voz, e para Érico Brás, pela agilidade de dominar uma comicidade
popular. Destaques da montagem: a direção musical de Maria Teresa Madeira e os
arranjos de Leandro Braga.
Crítica/ Para
Sempre, Abba
É como show que esse musical em cartaz no Teatro
Clara Nunes acaba por se realizar, apesar de tentar dramatizar coletânea de músicas do grupo Abba. O grupo sueco, que
se popularizou na década de 70, é mais um fenômeno de vendas do que
propriamente notável pela qualidade do repertório. Com suas músicas fáceis, letras pouco inspiradas e
monotonia das composições– ao ouvi-las em conjunto, essas características se
acentuam –, a transformação de canções inexpressivas em espetáculo não deixa de
ser um desafio. Rodrigo Cirne, roteirista e pesquisador musical, apostou na
lembrança daquela geração que comprou os discos do Abba e em alguns hits do
conjunto para armar uma vaga imagem – hóspedes e empregados de um hotel – e
quadros temáticos – apresentações e chegadas, flerte, paixão, decepção,
celebração, etc – para ilustrar a sequência de músicas. Não há, propriamente
enredo, mas entrecho visual, apoiado em exuberância e volume de figurinos. O
diretor Tadeu Aguiar administrou o material disponível, procurando dar vida
cênica às canções. Com coreografia convencional, direção musical que atende às
exigências das composições e elenco de bons cantores, a montagem deve embalar a
memória adolescente dos hoje sessentões.
Crítica/ Randevu
do Avesso
A ideia é acondicionar a revista em invólucro
atualizado. A estrutura explora o gênero, através de um fio de história em que,
absurdamente, os personagens são os órgãos internos do corpo de um estrela do music hall. Em quadros cômicos e
musicais, números de plateia e velhas piadas de duplo sentido, essa revista
pelo avesso repete com reduzida inventividade e sem o vigor da recriação supostos
exemplares da Praça Tiradentes e arredores. Por mais desencontrado que possa
parecer esse revival de espírito e
brilho apagados, a equipe demonstra empenho em se lançar na empreitada. O texto
de Cláudia Mauro, desequilibrado, a música original de Claudio Lins, empenhada,
o figurino de Claudio Tovar, farto, e o cenário de Nello Marrese, sobrecarregado, mostram dissintonia com o gênero.
Os atores, com maior ou menor capacidade para o canto, com mais ou menos,
segurança para o improviso, desempenham seus tipos em várias cenas, a maioria
um tanto alongadas, o que estende a duração da montagem para além do tempo desejado
para um divertissiment malicioso. O
caráter de revista de bolso não é suficiente para acomodar Randevu do Avesso ao espaço do Café Pequeno: o espetáculo extravasa os limites exíguos do teatro.
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