quarta-feira, 17 de janeiro de 2018

Temporada 2018

Crítica do Segundo Caderno de O Globo (17/1’2018)

Crítica/ “O homem no espelho”
Um bom foco sobre o canto de um ídolo


O repertório musical de Michael Jackson é o material cênico para que cinco intérpretes construam dramaturgia sonora com reflexos na imagem do ídolo pop. Não é apenas show teatralizado, ou sequência de sucessos em batida evocativa. “O homem no espelho” percorre conflitos insinuados por canções e vida de Jackson, recondicionando os originais com versões que destacam aspectos de letras e ritmos. O que surge dessa galeria de impressões, se distancia da simples reprodução de arranjos e de imitações coreográficas, para avançar sobre manifestação artística e suas ressonâncias  dramáticas. Com direção de Kika Freire e roteiro, arranjos vocais e direção musical de Jules Vandystadt, essa exibição performática-musical se apropria de sons e sinais marcantes para encontrar expressão própria, revitalizando feição cristalizada com sopro esperto. O domínio teatral se enfraquece em  soluções irrealizadas, como nas dispensáveis intervenções do marionete. E deixa dúvida, se o contraponto sonoro que se procura no cenário metálico de Teca Fichinski é uma forma de uso do é projetado apenas como ambientação. Mas na maioria dos sete blocos de canções, a montagem adota teatralidade que espelha a necessidade de curar o mundo das mazelas que abatem crianças perdidas e nas falsas diferenças que comprometem a natureza humana do amor. A maquiagem dos atores, que se despem da máscara quando o homem fica diante da sua verdadeira imagem, corporifica a dramática de um espetáculo que tem na música o eixo narrativo. No desenho de luz de Paulo Cesar Medeiros e no figurino de Teca Fichinski, a encenação confirma o rigor construtivo e a empatia com a plateia que acompanha a apresentação de pouco mais de uma hora. A alta qualidade da tripla função de Jules Vandystad corresponde ao apurado nível de execução dos músicos _ Herberth Souza, Naife Simões, Matias Corrêa e Thaís Ferreira – e do elenco. Do medley inicial às citações surpreendentes ao samba e ao Olodum (referência ao clipe gravado no Brasil), Jules ressalta Jackson sobre outra perspectiva. Longe de eventuais acusações de traição, o arranjador harmonizou, com sutilezas tonais, comentários de uma seleção apurada. Sem destaques no coeso grupo de atores-cantores, a musicalidade se amplia em vozes que individualizam timbres para o coro de boas atuações. A participação feminina – Ester Freitas, Evelyn Castro e Gottsha – e a masculina – Raphael Rossato e Jules Vandystad – dá a medida de como ótimos cantores interpretam personalidade musical única.