Crítica do
Segundo Caderno de O Globo (17/1’2018)
Crítica/ “O homem
no espelho”
Um bom foco sobre o canto de um ídolo |
O repertório musical de Michael Jackson é o
material cênico para que cinco intérpretes construam dramaturgia sonora com
reflexos na imagem do ídolo pop. Não é apenas show teatralizado, ou sequência
de sucessos em batida evocativa. “O homem no espelho” percorre conflitos insinuados
por canções e vida de Jackson, recondicionando os originais com versões que
destacam aspectos de letras e ritmos. O que surge dessa galeria de impressões,
se distancia da simples reprodução de arranjos e de imitações coreográficas,
para avançar sobre manifestação artística e suas ressonâncias dramáticas. Com direção de Kika Freire e
roteiro, arranjos vocais e direção musical de Jules Vandystadt, essa exibição performática-musical
se apropria de sons e sinais marcantes para encontrar expressão própria,
revitalizando feição cristalizada com sopro esperto. O domínio teatral se
enfraquece em soluções irrealizadas,
como nas dispensáveis intervenções do marionete. E deixa dúvida, se o
contraponto sonoro que se procura no cenário metálico de Teca Fichinski é uma
forma de uso do é projetado apenas como ambientação. Mas na maioria dos sete
blocos de canções, a montagem adota teatralidade que espelha a necessidade de
curar o mundo das mazelas que abatem crianças perdidas e nas falsas diferenças que
comprometem a natureza humana do amor. A maquiagem dos atores, que se despem da
máscara quando o homem fica diante da sua verdadeira imagem, corporifica a
dramática de um espetáculo que tem na música o eixo narrativo. No desenho de
luz de Paulo Cesar Medeiros e no figurino de Teca Fichinski, a encenação confirma
o rigor construtivo e a empatia com a plateia que acompanha a apresentação de
pouco mais de uma hora. A alta qualidade da tripla função de Jules Vandystad
corresponde ao apurado nível de execução dos músicos _ Herberth Souza, Naife
Simões, Matias Corrêa e Thaís Ferreira – e do elenco. Do medley inicial às
citações surpreendentes ao samba e ao Olodum (referência ao clipe gravado no Brasil),
Jules ressalta Jackson sobre outra perspectiva. Longe de eventuais acusações de
traição, o arranjador harmonizou, com sutilezas tonais, comentários de uma
seleção apurada. Sem destaques no coeso grupo de atores-cantores, a musicalidade
se amplia em vozes que individualizam timbres para o coro de boas atuações. A
participação feminina – Ester Freitas, Evelyn Castro e Gottsha – e a masculina
– Raphael Rossato e Jules Vandystad – dá a medida de como ótimos cantores interpretam
personalidade musical única.