São Paulo
Crítica/ A Dama
do Mar
Desde os anos 70, quando Bob Wilson apresentou no
Brasil pela primeira vez uma construção cênica que se estabeleceria como uma
das linguagens teatrais mais integralmente pessoais da cena contemporânea, que
a cada nova vinda (várias vezes a São Paulo, poucas ao Rio) reafirma o caráter fundador
da sua expressão artística. Com a quarta montagem em menos de um ano na capital
paulista, Wilson está em cartaz no Sesc Pinheiros, com A Dama do Mar, versão de Susan Sontag para o original de Henrik
Ibsen, com elenco inteiramente brasileiro. Remontagem do diretor americano,
estreada em 1998, o texto simbolista do autor norueguês, revisado pela
escritora americana, recebeu o enquadramento aos cânones visuais e sonoros a
que são submetidos quaisquer peças que a sua máquina de som e luz, gestos e
ruídos, claro e escuro, padronizando-se como
narrativa que percorre uma linha do tempo digital. Dos primeiros espetáculos,
que introduziram a gramática do diretor, se conservam métodos e modos de
ritualizar movimentos e atuações sob rígido desenho, no qual o palco se
transforma em quadro vivo, em que o efeito plástico se sobrepõe e redimensiona
o dramático. No ano passado, Wilson
mostrou A Ópera dos Três Vinténs que se ajustou com precisa geometria ao
balé-performático-minimalista do diretor, da mesma forma que o drama de Ibsen. Em
semelhante arcabouço estético, A Dama do
Mar é projetada em estrutura visual compacta para alcançar o onírico, redesenhado
o sentimento através da fixidez e impermeabilização da imagem. Às palavras
correspondem gestos que as dramatizam pela
exacerbação, entrecortadas por sonoridade que marca a ruptura das emoções e
expostas como componente de um sonho de traços ascéticos. Será que, desta
maneira, o texto de Sontag-Ibsen desaparece em detrimento do visual? Talvez,
mas é sempre compensador assistir a montagens de Bob Wilson, um dos mais
fulgurantes encenadores do século XX.
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