Montagens paulistas em cartaz no Rio
Crítica/ Oresteia
Em Oresteia, como também em As Suplicantes, Os Persas, Sete Contra Tebeas
e Prometeu Acorrentado, que
Roberto Alvim e o grupo Club Noir apresentam em dias alternados no Espaço Sesc,
a tragédia de Ésquilo é sintetizada, não só cênica, como temporalmente. Em duas
partes, com menos de 60 minutos no total, a Oresteia
se desidrata de aspectos narrativos (a trama se torna secundária), elimina
referência ao drama (as vozes se
articulam no espaço poético), e se transfigura em quadro (o movimento é quase
estático e a luz quase escuro). Num quadrilátero, com os atores em silhuetas,
postados em rígida composição, ouvem-se, do fundo desse lugar de sombras, palavras
que evocam, mais do que contam. Com um neón ao fundo, a única luminosidade fixa,
e figuras de vestes pretas, que se desenham como contornos, se obscurece o
olhar, esvaziado de imagens, modificações e ação.
É como se a cena fosse apagada de suas prerrogativas visuais, reduzida à possibilidade
de fruição como sonoridade, como se buscasse um ruído de ancestralidade e o
projetasse no barulho da contemporaneidade. Ao apagar a visão direta, acende-se
a provocação de olhares, tantos quanto cada espectador que se defronta com a
encenação possa vir a emprestar-lhes significações. Lançam-se entonações que
são capturadas sem lógica sequenciada
e por percepções exploratórias múltiplas, que o espetáculo propõe, provocadas
por sua delineada estrutura corajosamente pulsante e vivamente desestabilizadoras
de cânones.
Crítica/ umnenhumcemmil
Com esta
adaptação do romance de Pirandello, o ator Cacá Carvalho está de volta ao
Teatro Glaucio Gill e ao autor italiano com o qual tem convivido no palco nas
últimas duas décadas. A notória admiração de Cacá por Pirandello talvez tenha
exorbitado na medida desta transposição do literário para a cena. A dramaturgia
resultante do original pirandelliano, em que as obsessões do autor (identidade
e personagem, julgamento e aparência, forma e realidade) predominam como
imagens, é exposta com a mesmo caudaloso jorro com que se desenvolve no papel,
sem correspondente ajuste no palco. Monólogo dirigido por Roberto Bacci, para o
qual a plateia é solicitada a preencher a cena e figurar como cenário, não consegue se desprender da
narrativa literária, por maior que seja o esforço do ator em ilustrar o
substrato da escrita. Para tanto, Cacá Carvalho recorre a seu arsenal
interpretativo, com seu peculiar domínio vocal, maleável máscara e pródiga
gesticulação. Nesse acúmulo de efeitos, Cacá se distancia do adensamento para
afogá-lo em jogo exibicionista. Em
quase duas horas, o ator se entrega com tal empenho a reescrever imagens
literárias que o descompasso da tradução cênica alcança somente honesta
intencionalidade.
macksenr@gmail.com