segunda-feira, 22 de abril de 2013

14ª Semana da Temporada 2013


Crítica/ Aos Domingos
Mulher solitária em almoço da família
Julia Spadaccini tem demonstrado em outros textos já encenados domínio da escrita teatral com acurada perspectiva para a sua concretização cênica. Diálogos intensos, situações múltiplas, jogo de identidades, Spadaccini manipula com destreza a movimentação desses elementos, capturando em ações voláteis sentimentos de modos de viver atuais. Em Aos Domingos, em cartaz no Teatro Glaucio Gill, a autora desvia-se de sua curva para enveredar pela reta do realismo. A construção de estrutura sequencial e coerente, sustentada por veracidade psicológica que projete alguma emoção ou percepção do real, está desenhada em traços disciplinados neste texto. O encontro de irmãos em almoço de domingo, em que lembranças, ressentimentos, melancolia, culpa e solidão se alinham numa prestação de contas afetiva, não desmente as qualidades da autora revelados em diferente registro dramático. Ainda que se possa apontar algum desequilíbrio no comportamento dos personagens (são algo esquemáticos em seu desenvolvimento), na condução da narrativa (uma das chaves de relacionamento é perceptível a meio da história) e nas coordenadas da ambientação (a atmosfera se esvai logo de início), Aos Domingos revela nova linha exploratória na dramaturgia de Julia Spadaccini, derivativa, mas possível. Bruce Gomlevsky coordena esse material com mão discreta, procurando mais a fluência do que a impressão de alguma marca de direção. Gomlevsky  peca mais pelo que deixa de fazer, do que propriamente pelo que faz. A utilização das canções de Edith Piaf, que se supõe estejam nas rubricas, são excessivas e enfraquecem a sua eventual função dramática. E o diretor não economiza em suas execuções. A concepção cenográfica de Nello Marese e Natalia Lana empobrece a cena, tanto nos dois elementos laterais, a árvore e o balanço, quanto na transparência de fundo e na  projeção no final. O diretor se apropria do cenário com pouca inventividade, como nas duas vezes em que usa o balanço. Juliana Teixeira adota um tom nervoso, de intensidade maior do que, aparentemente, pede a personagem, mas ainda assim ultrapassa com alguma nuance a perigosa vizinhança da histeria. Jorge Caetano não alcança, com presença tímida e equidistante, a figura do irmão. Bruno Padilha, no menos convincente personagem, cuja chegada e saída dão a medida de sua mera passagem, não tem muito o que desenvolver em cena. Paulo Giardini é que se mostra mais à vontade como o marido insensível e grosseiro.             

Crítica/ Calango Deu!
Contadora de causos para platéia passadista
Essa reunião de “causos de Dona Zaninha”, que está encerrando temporada no Teatro Glauce Rocha, sempre com ótima repercussão de público, é o espetáculo de diminutivos, a começar pela personagem-título. A atriz e autora mineira Suzana Nascimento reuniu memórias de infância, costumes da sua terra, histórias fantásticas e cantos que se entoam, ou entoavam, entre montanhas das Gerais. Suzana transcreve, cenicamente, a recolha desse vasto material, recorrendo ao espírito de uma mineiridade real e ficcionada, verdadeira e imaginária. Para tanto, cria situação de intimidade com a plateia, servindo café e cachaça aos espectadores, falando com prosódia típica de várias regiões mineiras de lembranças do trem de ferro e do rádio, de alpendres e de modinhas, ora ingênuas, ora maliciosas. Em Calango Deu! transpõe-se a geografia nostálgica do minerim, da tagarelice de Zaninha, dos sabores do pãozinho de queijo, do cafezinho feito na hora e da cachacinha artesanal, para apresentar relicário de pequeninos retratos de prosa sobre Minas. Por entre caixas desdobráveis em que vão surgindo, cozinha, sala, oratório, quarto, a atriz vestida com rendas, que evocam tempos passados, desfia manifestações da cultura interiorana com expressiva intimidade com tal universo. O diretor Isaac Bernat traduziu essa intimidade com igual simplicidade com que a atriz conta, em aproximadamente duas horas, sua histórias ingênuas e atraentes para público nostálgico. A comunicabilidade do espetáculo pôde ser medida em apresentação, ainda na última temporada no Teatro Café Pequeno, em que uma platéia, com média de idade de 70 anos, estava enlevada com a atriz e suas histórias, e participava com evidente prazer de cada canção ou palavra que parecia reviver-lhes o passado. Calango Deu! alcança com seus inhos, de maneira certeira, aquele que é o seu público preferencial, os passadistas.           

                                                       macksenr@gmail.com