Crítica/ Gozados
Amy Winehouse em versão ainda mais politicamente incorreta |
O trocadilho e a sugestão do título apontam
para o tipo de humor deste show de
comédia em cartaz no Teatro dos Quatro. Gozados
é sequência de Subversões, que
desde 1990 vem cativando platéias com versões nada reverentes de canções
populares. A última temporada de Subversões
aconteceu meses antes da estréia de Gozados,
o que demonstra o poder de atração dessa brincadeira longeva. Em temporadas
intermitentes, o original permaneceu em cena, conquistando públicos de gerações
diferentes, formando cultores de suas
letras-paródias de variadas músicas. Provavelmente é para atrair essa platéia
seguidora que Luiz Salem, ator, e Stella Miranda, diretora, da primeira versão
retomam a mesma trilha, agora com ambos no palco, na tentativa de repetir a
fórmula. Se a intenção terá sido esta, talvez consigam sucesso pela fidelidade,
ainda que, por precaução, apresentem um número retirado de Subversões.
Mas se, ao contrário, a dupla pretendeu ampliar
a brincadeira, Gozados perde na
comparação, em vigor e espírito, já que músicas e esquetes pesam na excessiva insistência
em ambuiguidades sexuais e no linguajar vulgar. Quadros longos e pouco
comunicativos, como os dos musicais e da cantora Amy Winehouse, desequilibram
e quebram a voltagem do humor, que se mostra bem mais interessante quando
recorre à crítica mais depurada e a citações oportunas ao politicamente
correto. Quando esse cacoete hipócrita da vida social é exposto em seu
ridículo, Gozados ganha outra
embocadura na comicidade. Luiz Salem, bem mais à vontade e com inteiro domínio
da cena, tem participação solta e identificada com o material cômico. Stella
Miranda está mais contida e menos próxima ao estilo do humor que interpreta .
Crítica/ O
Filho da Mãe
Diálogo entre mãe e filho travestido em lugar comum |
Regiana
Antonini mantém o registro de comediógrafa em O Filho da Mãe, cartaz
no Teatro Vanucci, confirmando pelo humor o desejo de exaltar a maternidade como
vocação feminina incondicional. A mulher que é abandonada pelo marido transfere
frustrações, ciúmes e desejos reprimidos ao amor maternal. A convivência de mãe
e filho, do início da adolescência até a idade adulta do garoto, que está de
partida para o exterior, é exposta em tempos paralelos que se misturam para
apresentar o painel doméstico do relacionamento. A autora nem sempre domina a
técnica de flashback, e sua complacência
para com a comicidade fácil faz com que os diálogos, alguns até com observações
bem sacadas, se percam no lugar-comum. Mãe e filho são tipos, não exatamente
personagens, e estão, especialmente ela, a procura do riso como um fim em si
mesmo. Os monólogos sobre a “nobreza” da maternidade ficam deslocados em meio a
tantas piadas e reiteração da trama. O diretor e ator Eduardo Martini toma a si
a responsabilidade de encenar e
atuar, tentando fugir à montagem original de há três anos. Em travesti interpreta a mãe em composição
que traça o humor, exatamente pelo fato de ser um homem vivendo uma mulher. O
ator não exagera ou apela, fica no limite das possibilidades de comicidade
oferecida pelo texto. Bruno Lopes é o filho.
Crítica/ Na
Sobremesa da Vida
Conversa de um ator sobre sua carreira |
Baseado
no perfil de Emiliano Queiroz, publicado na Coleção Aplauso, o espetáculo que
tem o mesmo título do livro e a mesma autora, Maria Letícia, está em cena no
Teatro dos Quatro. Tanto livro quanto espetáculo revelam o desejo do ator de
contar sua história no teatro, cinema e televisão como balanço profissional de
60 anos de atividades. Emiliano tem boas histórias a contar, desde o começo em
Fortaleza até as pitorescas vivências como autor de novelas, a criação de
Veludo em Navalha na Carne e da Geni
na Ópera do Malandro. A montagem,
assinada por Ernesto Piccolo, arruma com bastante modéstia a versão teatral do
perfil escrito. Com a participação de Ivone Hoffmann, Antônio dos Santos e Ana
Queiroz, coadjuvantes do personagem principal e único, a montagem é arrastada,
artesanalmente pobre, que tem na vontade de Emiliano Queiroz compartilhar com o
público uma trajetória de tantos anos. É dele o palco.
Crítica/ Michael e
Eu
Não basta ter uma idéia, ou se encantar por um
desejo para fazer deles uma criação artística. Por mais que o autor desta
sucessão de vídeos e de mal alinhavada costura de arremedo de trama se lance em
temporada no Teatro do Leblon, as razões para encená-los, quaisquer que sejam,
se mostram insuficientes para levantar tão
banal empreendimento. Marcelo Pedreira baseou-se na história real de um fã
fanático de Michael Jackson, colecionador de todo tipo de memorabilia sobre o cantor, capaz de atitudes cotidianas, ou
ausência delas, que se regulam por esta idolatria. Para tanto, criou um
psicanalista nada ortodoxo, um fanfarrão quase tão fora do ar quanto o
paciente, este, o fã sem rumo, os dois, personagens-pretexto para exibição de
cenas de shows de Michael Jackson. Não há nada que se assemelhe a um eixo
dramatúrgico, muito menos a roteiro de show oportunista. A trama é tão pífia
que pouco avança para além de descosturado arranjo cênico. O diretor Ivan
Sugahara coordena com mão solta esse material inconsistente, com um único
momento mais vivo, que pode ser considerado um golpe de teatro: a aparição da
figura de Jackson. No mais, uma abertura ao som de Carmina Burana, imagens inexpressivas e atores rotineiros. Pedro
Henrique Monteiro parece um fã sem paixão. Bruno Garcia, um psicanalista
caricato.
macksenr@gmail.com