quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Outros Palcos



São Paulo

Crítica/ 12 Homens e uma Sentença
Emoção e razão num julgamento de argumentos 
A origem é um roteiro escrito na década de 50 para teleteatro da CBS americana, e que foi levado em 1957 para o cinema com direção de Sidney Lumet. O autor, Reginald Rose, ficou esquecido, mas esta obra, perfeita expressão de um certo tipo de dramaturgia, realista, comunicativa e repleta de ganchos dramáticos, sobrevive a seu desaparecimento. A construção desta narrativa obedece a regras bem definidas de playwriting, às quais se acrescentam segurança e domínio da narrativa, e diálogos ajustados às características bem definidas dos personagens. A trama reúne grupo de jurados para decidir absolver ou executar o réu, que é acusado de assassinar o pai. A decisão deve ser por unanimidade, e 11 dos jurados decidem condená-lo, e apenas um questiona a decisão da maioria. O texto acompanha os diversos argumentos que esse dissonante jurado lança para introduzir a desconfiança no apressado veredicto, e modular  as opiniões definitivas de cada um. Em paralelo a esse desdobrar de dúvidas, se desenha, através das atitudes de cada um, o caráter social de suas vidas. Conduzindo o espectador pelos meandros das personalidades, e costurando os argumentos para confrontar as certezas levianas, Reginald Rose arquiteta envolvente caminhada até a verdadeira unanimidade, que é atingida, não pela emocionalidade das sensações, mas pela racionalidade do pensamento. Eduardo Tolentino de Araújo, que dirige esta versão teatral em cartaz no Tucarena, orquestra com elenco ajustadíssimo aos contornos realistas do texto, os traços exatos que o gênero solicita. Tolentino cria movimento circular na cena, que acompanha as transformações por que passam os jurados com ritmo que segura a platéia nos 110 minutos do espetáculo. Os atores – não há destaques no grupo em que os intérpretes projetam os personagens de forma tão adequadamente elaborada – girando em torno de uma grande mesa, fixam posições que deixam ainda mais envolvente a montagem. Excelente exemplar de montagem inteligente e bem executada, que merece ser vista pelo público do Rio.  
       
Crítica/ Cabaret
Show feérico sem lastro dramático
A onda dos musicais, que está longe de baixar a sua força nas nossas praias, não deixa escapar títulos tradicionais, como este Cabaret, de 1966, que depois de versão cinematográfica, de 1972, pode ser considerado, de certa maneira, um clássico do gênero. Na adaptação de Miguel Falabella e direção de José Possi Netto, em cena no Teatro Procópio Ferreira, a distância do tempo da estréia na Broadway e da produção no cinema se mostra bem visível no relativo desgaste do libreto e da música. O que cada um deles conserva, como qualidades (a urdidura da trama e algumas melodias), não ficam comprometidas pela passagem dos anos. Mas o que este musical provocava de impacto, se perdeu irremediavelmente. Nesta montagem paulista se evidenciam ainda mais as perdas, já que a direção torna um tanto secundária a ação dramática (a ascensão do nazismo e o clima de decadência da Berlim dos anos 30), em favor de moldura de show, de féerie. O clima sombrio que envolve o musical, ficou em plano secundário,. Mas este é somente um detalhe, em meio a essa avalanche de musicais no mercado brasileiro, que além de responder à bilheteria, consolida a qualidade artística dos elencos. Cabaret se inclui nesta corrente, e por maiores que sejam as discordâncias são creditadas a considerações de estilo. Claudia Raia, por exemplo como Sally Bowles, ultrapassa a personagem com interpretação próxima a de seu temperamento de show woman. A atriz se baseia numa composição exibida, em busca de brilhar, mais do que agarrar a personagem. Os demais atores têm desempenhos que se enquadram nas exigências do gênero, se destacando Jarbas Homem de Melo, como mestre de cerimônias, Liane Maya e Guilherme Magon.            


Crítica/ Hécuba
Carga dramática sobre tragicidade visual
O diretor Gabriel Villela investe na tragédia de Eurípedes com os meios visuais e dramáticos que são inseparáveis em suas encenações. Com adaptação extremamente concisa, na qual a vingança de uma mãe submetida a questões de poder é tratada, menos com rigor trágico, e mais como modulação estética. A montagem em cartaz no Teatro Vivo, se impõe, fundamentalmente, pela riqueza dos figurinos. A palavra, o eixo em torno do qual o trágico se estrutura, fica por demais envolto por esta visualidade impositiva, que parece se renovar a cada cena. A beleza das máscaras e o colorido das vestimentas sufocam a fruição da palavra, distanciada pela construção da figura, oposta à pontencialidade do trágico. De certo modo, a encenação do diretor mineiro se afoga no quadro, não perimitindo que se avalie a sua real intenção de trazer Hécuba à cena nos dias atuais. A condensação aponta para mergulho raso, em que não se atinge o centro daquilo que se poderia considerar como tragicidade contemporânea. A teatralidade demarcada por esse substrato cenográfico, faz desaparecer a força da voz trágica para deixá-la apenas esboçada. Walderez de Barros tenta manter uma Hécuba sintética em plano interpretativo denso, consegue apenas levá-la num tom marcadamente dramático.

                                                            macksenr@gmail.com