Porto Alegre
Mineiros em Temporada Sulista
Em sua 11ª edição, o Festival do Teatro Brasileiro leva aos estados sulistas grupos mineiros, em intercâmbio que já contabilizou companhias baianas, cearenses e pernambucanas em temporadas por cidades de Minas, Rio, Espírito Santo e Nordeste. A seleção de montagens de Belo Horizonte que circula por regiões distantes de sua origem e se exibe para plateias de cidades paulistas, paranaenses e gaúchas, até meados deste mês, é uma amostragem da produção e da diversidade teatral mineiras. Na etapa de Porto Alegre, a plateia local pôde avaliar Tio Vânia, o mais recente espetáculo do Grupo Galpão, que estreou nacionalmente no Festival de Curitiba, em abril. A encenação de Yara de Novaes para o texto de Anton Tchecov mantém a alternância do repertório e de diretores, no momento em que o Galpão completa 30 anos. A entrada na idade do amadurecimento, registra o tempo e a inexorabilidade de sua passagem, matérias tão sensíveis ao autor russo, não por acaso escolhido para marcar o aniversário do grupo. Uma tentativa de viragem, de ampliar possibilidades, de tocar indefinições futuras. Mas a versão de Tio Vânia reflete mais a tensão pela passagem do tempo do que transição que aponte para além das referências passadas. Há nesta investida na “monotonia cinza” tchecoviana, nos diálogos amargos e na desesperança da imobilidade que ecoa nas vidas dos personagens, um esvaziamento da carga emocional que conduz à inação em que patinam essas figuras desgarradas. O temperamento interpretativo do elenco se mostra um tanto inadequado ao tom “exuberante” e expositivo da poética popular que o elenco traz da trajetória dos espetáculos de rua. Pouco sensibilizados para o universo do qual se aproximam sem convicção, com incompatibilidade física com os personagens, os atores de Tio Vânia confirmam que a encenação pode ser vista como pausa para repensar o já realizado, avaliar o já conquistado, e lançar-se, com ousadia, ao desconhecido do que ainda pode vir. A Cia Luna Lunera levou ao Sul duas das suas montagens: Cortiços, baseado no romance de Aluísio de Azevedo, um exemplar da literatura naturalista do século 19, e Nesta Data Querida, criação coletiva do grupo. A projeção nacional do Luna Lunera com o bem-sucedido Aqueles Dois, conto do gaúcho Caio Fernando Abreu, encenado em inventiva integração dos atores, parece ter sido o ponto de inflexão na sua trajetória. A partir das duas montagens apresentadas em Porto Alegre, ambas anteriores a Aqueles Dois, pecebe-se a inquietação por desvendar alternativas, mas demonstram os relativos descaminhos deste percurso. Em Cortiços se aproximam do naturalismo através do coreográfico, o que esvazia as duas linguagens. Ao fornecer as informações e os perfis de personagens tão marcadamente delineados, o Luna recorre até a um aviso, em meio ao espetáculo, para explicar o que se passa no palco. É o reconhecimento da perda do domínio dramatúrgico em plena cena. Nesta Data Querida se mostra como jogo improvisado, que surge na sala de ensaios, mas de identidade anêmica no palco. |
Com a autoridade de anos de exercício de teatro de rua, Eduardo Moreira, um dos fundadores do Galpão, assina a direção e a colaboração na dramaturgia de Próxima Edição, da Companhia Malarrumada. Essa reunião de três esquetes, de inspiração inegável em textos de Nelson Rodrigues, capturados no estilo do autor de Beijo no Asfalto, utiliza os mecanismos de espetáculos ao ar livre (uso de instrumentos musicais, interpretações farsescas, mascaras e truques de sensibilização dos espectadores). As historietas, com sabor novelesco e trama ingênua, ainda que com alguns toques bem maliciosos, atraem a atenção de plateia variada e popular. Na semana passada, numa das praças do centro de Novo Hamburgo, cidade a 40 minutos de Porto Alegre, Próxima Edição manteve, em pouco mais de uma hora, numa manhã fria, o interesse de público reduzido, mas atento, que ficou satisfeito com o que assistiu. A julgar pelo silêncio atencioso, pelos risos e aplausos com os quais manifestou a boa recepção para a montagem simples e direta, atingindo, despretensiosamente, o que pretendia.
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