Crítica do
Segundo Caderno de O Globo (7/3/2018)
Crítica/ Utopia D
– 500 Anos Depois”
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Em busca da utopia cênica |
Moacir Chaves volta, 13 anos depois da primeira
versão, a “Utopia”, narrativa de sociedade quimérica por Thomas More
(1478-1535), agora em edição compacta e com acréscimo ao título de “Utopia D –
500 anos depois”. Na carreira do diretor, que busca imprimir significados
cênicos a relatos que se circunscrevem à sobriedade do literário ou à frieza
dos documentos, essa sátira às instituições inglesas do século 16 e na
edificação de corpo social imaginado, é um ponto referencial. Tanto como em
2005, o diretor encena fragmentos do original, que são repetidos em tonalidades
variadas e entonações divergentes, alternando o dramático com o humor, a fala
dançada com a pausa estrondosa. Aquilo que é dito de formas diferentes, ganha
nas intenções, a unidade na crítica moralizante da política e na ironia do jogo dos contrários. Fala-se, ceticamente,
do tratamento dispensado aos que roubam para comer e dos castigos infligidos
àqueles que cometem supostos crimes contra a sociedade. E ainda da vaidade das
aparências. A reiteração dos textos, duplicados pelos formatos como são
expressos, torna possível a tradução cênica, mas alcança, muito parcialmente a
tentativa que imagina aproximar os tempos, atualizando a escrita de More. Há
necessidade de dar consistência teatral à palavra-manifesto, que dissocia a
verbalização do modo como é representada. A atual montagem agrava esse
descompasso pela redução do elenco e o papel secundário da música. Antes, eram
quatro atrizes. Hoje, um casal de atores. No passado, a distribuição no palco
privilegiava a modulação pelas individualidades dos meios interpretativos do
quarteto. Agora, se evidencia a descostura do ritmo. A música, antes mais
interveniente, foi substituída por sonoridade acessória, e a produção, cenário,
iluminação, figurino, agora bem modesta, reduzem ao básico o adensamento dos
variantes climas de atuação. A dupla – Josie Antello e Julio Adrião – se
desdobra na projeção de sentidos atribuídos a cada alternância de estilo,
sustentando os silêncios entre os monólogos, mas se afastando dos julgamentos
utópicos do autor, e das intenções do diretor de encontrar ressonâncias na
atualidade.