Crítica do
Segundo Caderno de O Globo (19/3/2017)
Crítica/ “O
grande sucesso”
Não chega a ser um novo estilo de musical, mas
acrescenta dramaturgia autorreferente ao gênero, expondo as semelhanças de
estar do lado de cá (a realidade) e do lado de lá (o palco). Os instantes que
os atores aguardam para entrar em cena é o espaço temporal para cantar e
comentar os momentos de antecipar o espaço da ilusão. Atores e personagens se
encontram no território determinado pela vida, que como numa sessão teatral,
“começa, aí acontecem coisas e, aí, acaba”. Com humor cáustico, insinuações
líricas e doses críticas de autoajuda teatral, o autor e diretor Diego Fortes,
além das músicas de Alexandre Nero e
elenco brincam com os atrasos no cachê e as perdas de editais. E parafraseiam
Fernando Pessoa em poema em linha torta (“todos os meus conhecidos têm sido
campeões em tudo/ que bom que somos todos bons/ imaculados, infalíveis,
invioláveis e inocentes”). A grandeza do sucesso, diminuída pela enganosa
atração para alcançá-la, se repete como ironia no determinismo da finitude da
canção “Bactérias”. Em quadros, que antecipam as entradas em cena, o elenco
canta com letras discursivas, a ameaça do fracasso abismal e o lirismo de estar
só, em trilha sonora de variações rítmicas e tonalidades sensíveis. A montagem
tangencia boas ideias, se descosturando um tanto na realização, mas nada que
comprometa o sopro de artesanato inventivo que a cenografia de Marco Lima e o
design de luz de Nadja Naira reforçam. O visual atraente se complementa no
figurino de Karen Brusttolin e no vigasismo de Wilson Eliodoro e Junior
Mesquita A musicalidade envolvente da direção musical de Gilson Fukushima
encontra nas vozes dos atores a expressividade de um coro afinado. O elenco –
Alexandre Nero, Carol Panesi, Edith de Camargo, Eliezer Vander Brock, Fabio
Cardoso, Fernanda Fuchs, Marco Bravo e Rafael Camargo – é o instrumentista
deste concerto teatral em que “todos somos obrigados a viver sem saber como”.