Crítica do
Segundo Caderno de O Globo (17/2/2016)
Crítica/ “O último
lutador”
O tema central do texto de Marcos Nauer e Teresa
Frota é, apenas aparentemente, a luta livre. Um velho pugilista, pai de dois
filhos, também lutadores, os transforma em adversários no ringue e na vida, marcados
por mágoas e ressentimentos desde que foram separados ao longo dos anos. O
patriarca, hoje um empresário empobrecido de rinhas de galo e a beira da morte,
decide aproximar os netos, desconhecidos entre si e afastados pelos conflitos familiares
inconciliáveis dos pais, para disputa definitiva. Até chegar ao round decisivo,
em que todos lutam por recompensa financeira, briga-se por esconder
identidades, abater sentimentos, alternar atitudes e nocautear os embates
emocionais. Com a ação localizada na era Collor e com discutíveis ganchos que dispensam a falsa tensão e arranham
o melodramático, a narrativa acumula situações que se arrastam por um tempo
dramático descompassado e se desdobram em tramas soltas do eixo central. Há uma
indisfarçável vizinhança com a produção ficcional para a televisão, com excesso
de acontecimentos que se atropelam para sustentar a atenção e personagens
demais para apoiar os estratagemas dialogados. A impressão é a de que “O último
lutador” foi baseado em argumento (ou sinopse, na linguagem da televisão),
desenvolvido como capítulos em que cabem menos história do que podem tornar
verossímeis personagens tão esquemáticos. Recursos como concursos de tv que
ajudam a avançar a trama se repetem nos segredos antecipadamente descobertos ou
na revelação de que “os brutos também amam”. Sergio Módena administrou a cena
como um artesão que põe os instrumentos bem arrumados na bancada de trabalho. O
cenário de Aurora dos Campos utiliza tela de galinheiro como enquadramento para
o palco-ringue, em alusão à profissão do ex-pugilista. A iluminação de Tomás
Ribas procurar tira partido dessa teia tramada, enquanto Milton Vieira e Paulo
Oliveira demonstram, como instrutores de luta, a eficiente preparação dos
atores para as cenas de pugilato. A combinação desse urdido encaixe, permite que se atenue as
fragilidades e as lembranças novelescas que assaltam, sem tréguas, o texto. O
elenco, em atuações instáveis, acompanha a vulnerabilidade e o desequilíbrio
dos personagens. Carol Loback e Mari Saade ressaltam ainda mais a precariedade
dos tipos que interpretam. Glaucio Gomes e Antonio Gonzales tentam não sucumbir
a implausível irmandade. Marcos Nauer, com melhor presença, e Daniel Villas, em
tom linear, se destacam ao partir para a briga. Stela Freitas procura imprimir
alguma função e consistência à acompanhante do patriarca doente. Stênio Garcia interpreta
o decadente boxeador sem particularizar qualquer das suas características, já
bastante limitadas pela própria natureza da sua má construção.