Crítica do
Segundo Caderno de O Globo (20/2/2015)
Crítica/ Eu e Ela
Um enfrentamento de mão única |
O primeiro texto teatral, como este de Guilherme
Fiuza, pode, tanto demonstrar o desejo de experimentar-se como autor de um
gênero inexplorado, quanto ampliar o espaço expressivo como exercício provocador
da escrita. A comédia sobre uma mulher que, ao sair do banho, se defronta com
uma barata, não deixa muito claro o alcance de suas ambições como dramaturgia e
a verdadeira extensão do esforço pela qualidade. Fiuza partiu da constatação, algo cristalizada pelo preconceito,
de que todas as mulheres têm pavor de baratas, e de que se tornam irracionais
quando confrontadas com um único exemplar do inseto. Retirar dessa piada pronta
narrativa com sustentação em diálogos com algum humor e originalidade é tarefa
para quem consiga ultrapassar a previsibilidade e o desgaste da ideia inicial e
confrontá-la com o seu próprio convencionalismo. Levar adiante situação que não
se desdobra ao longo de 60 minutos da montagem, acaba por se transformar em
relativo mérito. Apesar do abusivo recurso ao uso do telefone e das reações
descontroladas da apavorada mulher diante da incômoda visita, Fiuza procura
insuflar um pouco de ação para além do estático enfrentamento entre a mulher e a
barata. É insuficiente neste quase monólogo de comicidade rarefeita e
tentativas frustradas de comentários críticos da vida conjugal e do cotidiano
social, que aponta para o desequilíbrio entre o impulso de estrear novo métier e a grande distância da sua concreta
realização. Ernesto Piccolo não colaborou, com a sua direção linear e monótona,
para aparar as fraturas de texto hesitante. Explora com timidez as pequenas
sugestões que, eventualmente, poderia retirar da estática situação central. O
que anima a cena é o truque teatral do aparecimento da barata, que de início é
apenas um drone que sobrevoa o palco
como um sonoro besouro, para se agigantar como alegoria carnavalesca de uma
ameaçadora cascuda. De ótima confecção, a barata gigante de Clívia Cohen
colabora, decisivamente, para animar a sonolenta encenação. Claudia Mauro não
encontra o tom e ritmo adequados para alcançar o humor que o texto raramente oferece.