Musicais Ocupam o Eixo
Rio/ O Mágico de Oz
Fábula infantil com piscadelas aos adultos |
Essa fábula infantil, que o cinema popularizou e
a cultura do consumo transformou em ícone com múltiplos cultores, chegaria,
inevitavelmente, ao musical. E chegou a vez da platéia brasileira confirmar a
aura de encantamento e magia que O Mágico
de Oz acumulou ao longo dos anos
através da versão de Charles Möeller e Claudio Botelho em cartaz no
Teatro João Caetano. Mas será que esse musical ingênuo corresponde a tudo
aquilo que se lhe atribui? Como comédia musical é extensão da narrativa
original, bastante referenciada ao filme e com canções, pelo menos duas, com
alguma popularidade. E pouco mais. Nesta versão brasileira se confirmam as habilidades
dos nacionais no modo de encenação de musicais, no know how da técnica e nas qualificações da equipe artística, demonstrando
domínio do gênero e até de alguns acréscimos
e sotaques locais inventivos. Em Oz se prova, uma vez mais, a
criatividade na maneira de ser fiel às letras em inglês do versionista Claudio
Botelho, que as reinventa no nosso idioma. Também se confirma a eficiência no
domínio da complexidade técnica e artística exigidos por um tal empreendimento.
O elenco cumpre as funções. Então, por que O
Mágico de Oz não entusiasma? Como diversão infantil, talvez seja um tanto
longa para os padrões dos menores, provocando nas crianças as mesma queixas que
no passado a platéia adulta usava para rejeitar os musicais (música interrompe
a ação, o entrecho é desinteressante). A aura em torno da fabulação se perde
com um certo apelo a tantas significados que a história foi ganhando ao longo
do tempo. A atual montagem faz frequentes piscadelas aos adultos (o Leão ganha
conotação para além da covardia), ao ponto das melosas indicações moralizantes se
deslocarem ao segundo plano. O visual, propositada ou inadvertidamente, tem
forte conotação kitsch, em especial
nos figurinos de mau gosto e pretensiosos efeitos, e nas projeções pouco
elaboradas. O elenco, que teria no cachorro presença fundamental na história,
tem atuação indisciplinada, o que
compromete as cenas de que participa. Malu Rodrigues, a Dorothy, também fica
prejudicada pela pouca intimidade do animal com a disciplina. Pierre Baitelli
encontrou uma maneira de, através da dicção, desenvolver a comicidade do
Espantalho. Nicole Lama, como o Homem de Lata cumpre o seu papel, enquanto
Lúcio Mauro Filho exagera como o Leão Covarde. Maria Clara Gueiros tira partido,
com interpretação ajustada à platéia infantil, da figura da Bruxa Má. Luis
Carlos Miele, o Mágico de Oz, não aproveita o protagonismo do personagem. Kostyantyn
Biriuk como um Ciclone fora de lugar, se restringe a demonstrar suas
habilidades de malabarista.
São Paulo/ Fama
Arquitetura importada para atender à demanda |
Atualmente estão em cartaz cinco musicais nos
teatros paulistas, dos quais dois são produções cariocas. Para manter esse
ritmo de montagens é necessário importar, cada vez mais, originais da Broadway
e, em menor escala, do West End, já que musicais nacionais ainda não acompanham
as crescentes exigências mercadológicas. Para atender a essa demanda, os
critérios de escolha estão ficando um tanto elásticos, capazes de selecionar
exemplares de qualidade discutível e que, dificilmente, interessam às nossas
platéias. E algumas escolhas inexpressivas têm recebido a rejeição do público,
comprometendo a boa onda do gênero nas
últimas temporadas. Fama, que pode
ser visto no confortável Teatro Frei Caneca, tinha numa sessão de sexta-feira,
menos de um terço de espectadores nos seus 600 lugares. O que o público
demonstrava, pela ausência e pelas deserções durante a sessão, é o desinteresse
por musical inexpressivo, baseado em filme de relativo sucesso dos anos 80 e que
foi transferido para o palco com pouco empenho. O musical por origem um gênero
reiterativo, com códigos que devem ser obedecidos à risca, tem eventuais
ousadias em trilhas sonoras que valorizem entrecho, e que busquem temática que
tenha estofo dramático (leia-se
dramaturgia). Fama está longe de
ambos. As músicas são anódinas,
parecem saídas de cartilha de como fazer trilha padrão, e a trama não desperta
qualquer fagulha de atenção para acompanhar alunos postulantes a carreira
artística. Se Fama é tão pouco
estimulante, a sua versão nacional não é mais animadora. As condições de
produção e de técnica, vocal e corporal, se não são excepcionais, pelo menos
mantêm o nível alcançado por geração de atores, bailarinos e cantores
preparados para atender às exigências importadas do caderno de encargos dos musicais.
Mesmo que no elenco de mais de 30 componentes não hajam destaques, cada um
cumpre a sua participação com profissional eficiência, como de resto os demais
elementos da parte artística e técnica. Mas fica a certeza de que Fama serve apenas para confirmar a
capacidade nativa de reproduzir musicais estrangeiros, e de como o mercado
demanda novas produções com voracidade do modismo. E que é tão somente mais um
produto que se oferece ao público, que produtores imaginam cativo ao gênero,
mas que desta vez frustrou o planejamento. Aguardam-se as próximas
estréias.
macksenr@gmail.com