segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

Balanço da Temporada 2013

Teatro em Palavras e Imagens
Conselho de Classe: retrato da educação
Os movimentos internos do teatro carioca na temporada 2013 foram cautelosos, mas apontaram para algumas possibilidades exploratórias na dramaturgia e na ampliação dos recursos da cena. Foi o ano do estabelecimento de uma geração de autores, em torno dos 30 anos, que expandiram seu universo dramático em textos que confirmaram potencialidades. Jô Bilac, com Conselho de Classe, e em menor escala em Fluxorama, se reconcilia com a dramaturgia, depois de alguns textos pretensiosamente inovadores. Em Conselho de Classe, que marcou de maneira brilhante os 25 anos e a volta da Cia. dos Atores, Bilac fotografa com aguda observação e pertinente sentido crítico o estado agônico da educação. Julia Spadaccini também se destacou na temporada em três montagens (Porta da Frente, Aos Domingos e Um Dia Qualquer) que demonstraram a sua constante e crescente afinação de meios e alcance de sua linguagem. Renata Mizrahi se consolidou em textos de gêneros e ambições, às vezes até excludentes. Do realismo de Os Sapos à narrativa de relacionamento de  Caixa de Phosphorus e aos esquetes de Sarau das Putas, Mizrahi confirmou sua versatilidade. Daniele Ávila Small surpreendeu com o pouco visto Garras Curvas e um Canto Sedutor, encontrando originalidade dramática e expressão autoral através de veios literários. Rodrigo Portela, a partir de Três Rios, mostrou que está construindo dramaturgia cênica despojada, simples e autoral, como atestam Antes da Chuva e Uma História Oficial. Diogo Liberano, que se revelou na temporada anterior com Sinfonia Sonho, transitou este ano entre poética do social em Maravilhoso, laboratório de formas em LaborAtorial e adaptação de romance em Vermelho Amargo, sempre com estimulante inquietação. O diretor-autor Moacir Chaves explorou, uma vez mais, a narrativa documentada para criar contundente espaço cênico em O Controlador de Tráfego Aéreo.  Mas sem dúvida, o grande texto da temporada, Incêndios,  veio do exterior e é assinado por Wadji Mouawad. Tragédia contemporânea com ressonâncias na grega, o texto do autor libanês percorre o desconhecido em busca da verdadeira origem com poética rascante e tragicidade impiedosa. 
Vermelho Amargo: cenário mutante

O visual, indissoluvelmente integrado à cena, à serviço da linguagem e com forte presença dramática pôde ser visto em montagens de gêneros e estilos bem diversos. Em Conselho de Classe, Aurora dos Campos projetou em traços realistas ginásio esportivo de escola pública como  ambientação viva dos conflitos. Rui Cortez desenhou o cenário de Moi e Lui com a sutileza subterrânea exigida por Beckett, com elementos que apontam, sem sublinhar. A iluminação desta montagem dirigida e adaptada por Isabel Cavalcante, tem iluminação prodigiosa de Tomás Ribas, na qual o  sombrio que aclimata contrasta com luminosidade que explode em momento especialmente denso. A cenografia de Bia Junqueira para As Mulheres de Grey Gardens, além de resolver com projeções a mudança de ambientes, construiu instalação de impacto que conferiu maior dramaticidade ao musical. Bia também foi responsável pelo melhor cenário do ano ao, praticamente codirigir Vermelho Amargo com sua concepção mutante de mandala, que se transforma em parangolé para que surja um quadro ilusório.  Mais do que um belo efeito estético, uma inteligente leitura visual do texto.  A cenografia de Rogério Falcão para Como Vencer na Vida Sem Fazer Força, com imponente entrada art-deco do edifício, painéis móveis que compõem os diversos ambientes e o hall dos elevadores criou cena límpida, decorativa, ampla e funcional. É a partir das imagens verbais do autor canadense Daniel MacIvor em Cine Monstro, que Enrique Diaz, diretor e ator, percorreu histórias e atalhos que conduziram à retaliação do corpo narrativo, em que palavras ganharam contornos físicos. 
Com curadoria da cenógrafa Lidia Kosovski a exposição A Mão livre de Luiz Carlos Ripper, que esteve por curtíssimoa tempo no Centro Cultural dos Correios, não apenas fez balanço da fértil produção de cenografia, figurino e direção do criador do espaço renovador do Teatro Ipanema na década de 70 para a celebração de Hoje É Dia de Rock, como dimensionou a sua inventividade também no cinema.

terça-feira, 17 de dezembro de 2013

41ª Semana da Temporada 2013


Crítica/ Vampiras Lésbicas
Cabaré-revista-show com data de vencimento
O conceito da ocupação Câmbio, que programa o Teatro Café Pequeno, onde pode ser visto esse musical saído da mesma fôrma do Teatro do Ridículo de Nova Iorque (o responsável pelo sucesso de Irma Vap), é de utilizar o espaço condensado da casa de espetáculos para afirmar a sua vocação de cabaré teatral. Em mais uma tentativa, o diretor e tradutor Jonas Klabin encena no ambiente de bolso do teatrinho do Leblon comédia com música, vagamente inspirada em filmes de terror e na cultura gay hollywoodiana, para satirizar, com tom de deboche, a vulgaridade camp e a dualidade sexual. Um estilo que nos anos 80 até alcançou algum êxito em escala internacional, mas que atualmente deixa a certeza de que o gênero está ultrapassado, entre outras razões, pelo desgaste de uso e repetição de fórmula. Klabin se  cercou de bem definida direção de arte de Marta Reis, iluminação vibrante de Luiz Paulo Nenen e competente direção musical e piano de Davi Guilherme. Esse apoio técnico garante que a leveza da montagem não seja comprometida pela tentativa de exagerar no aspecto crítico e bizarro. Na primeira parte, quando a historieta da rivalidade das vampiras vai até os primórdios da desavença, nem sempre se consegue manter o clima de diversão. Já na segunda, pela condensação da trama nos termos de um cabaré-revista-show, Vampiras Lésbicas se aproxima mais do espírito de humor nacional. Marya Bravo canta Masculino-Feminino com a mesma ironia da sua letra inteligente. E Thiago Chagas faz uma bem humorada imitação das entonações vocais de Fernanda Montenegro.       
  
Crítica/ Quando a Gente Ama
Dores de amor em ritmo de samba
O leit motiv  é o repertório de músicas de dor de cotovelo do compositor Arlindo Cruz, reunido pelo autor e diretor João Batista em torno de roda de samba e a pretexto de encenar  ritmo e, em especial, letras do sambista. Em cartaz no Teatro Sesc Ginástico, Quando a Gente Ama se divide em quadros que dramatizam, antecipando, as canções, o embate de sentimentos em que o jogo amoroso se submete a provas de resistência e durabilidade. No universo musical de Cruz, a permanência do amor, não importa as vicissitudes pelas quais passe, sobrevive ao ciúme, à rejeição, à paixão e  ao casamento. Este escalonamento de afetos, conduzido por sambas cariocas de marcada sonoridade suburbana, ganha a cena introduzido por situações que ecoam aquilo que se cantará em seguida. São mais de uma dezena de quadros que percorrem, como num pagode de fundo de quintal, na musicalidade e no estilo da atuação, a produção do compositor. Antes de parecer repetitiva e extensivamente uniforme, essa sequência de cenas intercalando as músicas vai, ao longo da montagem, adquirindo autonomia expressiva e adensamento teatral, que envolve, progressivamente, a plateia. Com visual de simplicidade sofisticada, assinado por Doris Rollemberg, iluminação igualmente requintada, de Renato Machado, e figurino de Mauro Leite, que veste as elegantes atrizes, o espetáculo tem ótima direção musical e arranjos de Marcelo Alonso Neves, que comanda o som vigoroso dos cinco músicos do conjunto. No integrado elenco, a voz de Wladimir Pinheiro é destaque pelo excelente timbre. Édio Nunes, David Junior e Milton Filho garantem a qualidade vocal dos intérpretes masculinos.. Entre as atrizes. Cris Vianna é uma bela presença no palco, enquanto Vilma Melo conduz-se com segurança na cena da amante desprezada, assim como Patrícia Costa ao interpretar o arrefecimento do relacionamento. Em plano mais discreto, Jéssica Moraes.        
  
Crítica/ Intimidades
Casal numa coreografia de movimento estático
Neste texto de Gustavo Machado, em cartaz no Teatro Glaucio Gil, um casal se defronta com a sua impossibilidade de conviver. Cada um, das cordas do ringue matrimonial, parte para a luta destruidora para abater o adversário, no passado o objeto amoroso. Os assaltos desse confronto, se repetem com alguma monotonia, sem levar nenhum dos combatentes à lona. Num caudal de palavras, muitas banais, algumas falsamente agressivas, os diálogos se voltam para a circularidade de situação única, sem que haja crescendo ou movimentos flexionados de ataque e defesa. As imagens verbais são extremados lugares comuns ao citar provérbios e atitudes que se desviam do centro do entrecho. Há um descarnamento dos personagens, enquadrados em categorias de comportamento (mulher neurotica x homem fraco, acúmulo de frustrações de casal x perda de identidade individual). O diretor Bruce Gomlevsky desenhou a montagem como coreografia de opostos, figurando a luta como balé de contrários. De certa maneira, foi o que Gomlevsky parece ter escolhido para encontrar a ação interna , e deste modo atenuar a aridez emocional do texto. O cenário de Nello Marrese, que se desvenda  ao longo da encenação, cria num primeiro momento forte efeito onírico, se esvaziando, no entanto, pela utilização pouco inspirada em várias cenas depois. A iluminação de Elsa Tandeta aproveita bem a construção cenográfica. O casal de atores – Roberta Alonso e Joaquim Lopes – se mostra bem ensaiado ainda que não alcance a humanidade daqueles que interpretam, mesmo considerando  os limites dos seus personagens.      


                                                        macksenr@gmail.com

quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

Prêmio Cesgranrio


 Finalistas do 2º Semestre da Temporada 2013 

Foram selecionados os finalistas do segundo semestre da primeira edição do Prêmio Cesgranrio de Teatro. Os vencedores serão conhecidos no dia 21 de janeiro em festa no Copacabana Palace. 
  
Conselho de Classe: cinco indicações

Diretor: Bel Garcia e Susana Ribeiro (Conselho de Classe)
             Aderbal Freire-Filho (Incêndios)
             Denis Carvalho (Elis, A Musical)

Ator: Daniel Dantas (Quem Tem Medo de Virgina Woolf?)
         Marcelo Olinto (Conselho de Classe)
          Enrique Diaz (Cine Monstro)

Atriz: Marieta Severo (Incêndios)
          Zezé Polessa (Quem Tem Medo de Virginia Woolf?)
          Solange Badim(Deixa Que Eu Te Ame)

Cenografia: Bia Junqueira (Vermelho Amargo)
                    Aurora dos Campos (Conselho de Classe)
                     Paulo de Moraes (Jim)

Iluminação: Luiz Paulo Neném (Incêndios)
                    Maneco Quinderé (Jim)
                    Maneco Quinderé (Elis, A Musical)

Figurino: Tanara Schornadie (A Importância de Ser Perfeito)
                Marília Carneiro (Elis, A Musical)
                Carol Lobato (Cazuza)

Autor: Julia Spadaccini (Porta da Frente)
            Renata Mizhrai (Os Sapos)
            Jô Bilac (Conselho de Classe)

Direção Musical: Délia Fischer (Elis, A Musical)
                            Ricardo Góes (Pacto – Relações Podem Ser Fatais)
                            Ricco Vianna (Jim)

Ator em Musical: Emílio Dantas (Cazuza)
                            Eriberto Leão (Jim)
                            Délia Fischer (Elis, A Musical)

Atriz em Musical: Laila Garin (Elis, A Musical)
                             
Especial: Alonso de Barros, coreografia de Elis, A Musical
                José Polessa Dantas, tradução de Quem Tem Medo de Virginia Woolf?
                Marcia Rubin, direção de movimento de Incêndios

Espetáculo: Conselho de Classe
                   Incêndios
               Elis, A Musical

quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

40ª Semana da Temporada 2013


Crítica/ Feliz Por Nada
 
Contraponto masculino para jogo feminino
A adaptação teatral de livro de Martha Medeiros, em cartaz no Teatro das Artes, captura o espírito da escrita da autora gaúcha. Cronista da vida contemporânea, registrando as transformações de comportamento e buscando “falar com o leitor”, Martha interpreta desejos e frustrações, capta impressões, estabelece conversas. Em Feliz Por Nada trata da amizade feminina construída na convivência das diferenças, perturbada por presença masculina potencialmente desagregadora. Com trama que não se caracteriza pela coerência de atitudes e pelo traço menos esquemático das personagens, o texto em cena, assinado por Regiana Antonini, se assemelha a compilação de conselhos  de revistas femininas de como as mulheres devem enfrentar as dificuldades afetivas. As amigas que se encontram no aeroporto de Tóquio, e a partir de então desenvolvem relacionamento sustentado, não se sabe muito bem em que, se tornam vozes para demonstrar as peculiaridades de personalidades unidas pelo eterno femininoCom material dramatúrgico pouco estimulante, o diretor Ernesto Piccolo seguiu a compartimentação das cenas entre monólogos explicativos, e diálogos reiterativos, e centrou nas duas atrizes a possibilidade de dar mais agilidade aos quadros. Sem qualquer cenário, e utilizando o palco largamente horizontalizado, Piccolo provoca um entra e sai, que complementa com tentativas de ocupar a totalidade do espaço, com o uso do fundo e do proscênio, o que não resulta, mesmo com a contribuição da luz de Aurelio di Simoni. A participação de Felipe Cunha, quase episódica, é o frágil contraponto masculino para que Luiza Thiré e Cristiana Oliveira reproduzam o tênue jogo feminino do texto. Ambas, com bons momentos de humor e alguma tensão um tanto deslocada, conseguem projetar as diferenças e afinidades das amigas em atuações convencionais, mas convincentes.

                                                macksenr@gmail.com