Crítica/ “Fim"
Magali Biff nas fronteiras do desbafo-manifesto |
É na finitude que a contemporaneidade se torna ainda
mais inescapável, e de que trata o diretor Felipe Hirsch em “Fim”. Fronteiras
da arte, história, linguagens, tempos, se diluem nos processos de criação,
vividos como enfrentamentos em batalhas que, a meio, já apontam para derrotas.
O exercício da invenção parece esgotado pela ausência de perspectivas menos
nebulosas, num momento em que experiências de buscar novos códigos esbarram na
impermeabilidade da recepção. Como em “Puzzle”, que marcou viragem na carreira
de Hirsch, a atual montagem em cena no Sesc Anchieta, na capital paulista, se
arma em quebra-cabeças de quatro quadros, escritos pelo argentino Rafael
Spregelburd. Em cada um deles, e nas contribuições de André e Sérgio Sant’Anna,
se distribuem as estocadas de humor cítrico e formas agridoces, num quarteto de
entrechoques, culminando com um ruidosa performance cética-demolidora. Na cena
inicial, “O Fim das Fronteiras”, os limites da expressão falada e dos
significados que se impõem a discurso com a amplitude da dispersão, Renato
Borghi joga palavras em inglês e canta
velho tango argentino, em tradução amalucada por Magali Biff. Em “O Fim da
Arte”, questões acadêmicas e papel do crítico, além da restauração do passado e
possibilidades de futuro, disparam tiroteio à hipocrisia de uma certa
terminologia e ironia na manipulação de preceitos. Amanda Lyra interpreta com o
corpo, conceitos enrijecidos, enquanto Rodrigo Bolzan implode o desuso da
palavra. Em “Fim da Nobreza”, talvez a menos ajustada das quatro cenas, a arte
é bufonaria para a elite mediada pelo dinheiro. Danilo Grangheia se faz duplo
para figurar absurdos. Já “O Fim da História”, quando grupo teatral algo
mambembe ensaia um clássico qualquer, expõe o incêndio destruidor do teatro
condenado à repetição e comprometido na sua sobrevivência pelos espectros da
atualidade. Mais do que posição niilista, que o título promete e a encenação não
compartilha integralmente, “Fim” é
desabafo-manifesto de um corte sem suturas.