quinta-feira, 13 de dezembro de 2018

Temporada 2018


Crítica/ "Outros"
Encenação dissonante de muitas inquietações

“Nós”, espetáculo anterior do Galpão, dirigido por Marcio Abreu, era uma construção coletiva de perplexidades e indefinições. “Outros”, do mesmo grupo e encenador, aparentemente estenderia a muitos, o que antes era encruzilhada de poucos para iluminar sua “região do escuro”. Mas a ampliação se restringe ao título, que não esconde as semelhanças entre a montagem de há dois anos, e a atual em cartaz no Teatro Ginástico. Nesta coletânea de show-performático-teatral-plástico, prolongamento das incertezas de “viver mas não existir”, ou da impossibilidade de ação real, e ainda da impotência provocada pelo imobilismo do senso comum de antes, repetem-se as mesmas inquietações, agora com maior carga de ceticismo. As dúvidas que a companhia mineira lançava, estão ampliadas agora quase até à  negação. No roteiro atual, a passagem do tempo é o ponto em torno do qual gravitam os demais impasses vividos pelo grupo. Não sem razão, os atores mais velhos são os porta-vozes do que assola o momento coletivo. Ao dizer que “tá tudo sem parâmetro”, o ator veterano desencadeia fluxo para capturar fragmentos de existência, em que o que vemos “são resíduos de imagens, e o que pensamos, resíduos de pensamentos”. A dramaturgia de Eduardo Moreira, Marcio Abreu e Paulo André reflete o sentimento de vazio e  oco, e de que o próximo instante será o último, num balaio em que se misturam discursos, que se traduzem em protestos formais, comportamentos em simbologia degastada e imaginação em palavras metafóricas. Na cena inicial de show com banda formada pelo elenco, a trilha musical anuncia em suas letras agenda de lutas sociais (“Deixa ela falar”, “Bicha”, “Vozes mudas”, “O abismo antes do nada”). Os diálogos que se pretende estabelecer entre o processo de criação cênica e a plateia, ganham sinais divergentes, que ora apontam para as entranhas do grupo, ora propõem quadros que jogam, recreativamente, com linguagens. Nenhum encontra convergência comunicativa, apenas paralelismos que não se demonstram reflexivos, confundidos com o aleatório. O desejo investigativo da cena e a identidade do depoimento parecem enfraquecidos na transposição dos  ensaios ao palco. A execução é de boa artesania. A cenografia de Marcelo Alveranga e, em especial a iluminação de Nadja Naira, contribuem para o visual límpido. A trilha e efeitos sonoros de Felipe Storino, além de músicas originais de parte do elenco e da atuante direção de movimento de Kenia Dias, acrescentam acabamento à direção de Marcio Abreu. O elenco – Antonio Edson, Beto Franco, Eduardo Moreira, Fernanda Vianna, Inês Peixoto, Júlio Maciel, Lydia Del Picchia, Paulo André, Simone Ordones e Teuda Bara -  interpreta tempos de desassossego com gana de devorá-los.