Crítica/ “Memórias
de Adriano”
Uma adaptação com horizontalidade |
Não são poucas as armadilhas para a adaptação de
obra literária para o teatro. Os recursos para a transposição se contraem na
medida da complexidade do original e pelas dificuldades enfrentadas, no novo
meio expressivo, de projetar a integridade do modelo. E não se trata apenas de
uma questão formal, mas de estabelecer correspondência em estilos distintos. A
versão teatral do romance “Memórias de
Adriano”, de Marguerite Yourcenar, assinada por Thereza Falcão, tem o inegável
mérito de condensar o relato autobiográfico em formato epistolar de Adriano ao
seu sucessor no trono, com o mínimo de perdas previsíveis no percurso do
transporte. O imperador e suas batalhas na guerra política e o homem de amores duplos e dúvidas incontáveis,
emergem, na escrita de Yourcenar, com força narrativa da vida que definha e do
poder que exerce. A extensão desta grandeza existencial que o livro dimensiona em
contexto histórico, sofre restrições e reducionismo quando ambientada para o
palco. É inevitável que isso aconteça com linguagens em escala diferente, mas as
exigências de entrecho e tempo cênicos diminuem a densidade do que é construído
como literatura e absorvido no ritmo das frases. Inez Viana busca atualização
temporal que, ao que parece, tentaria aproximar a plateia de um universo que
soa distante e pouco comunicativo. Se esta foi a razão, a diretora acentuou o
que a adaptadora não procurou driblar. A presença de músico em cena se
justifica para preencher os intervalos entre os movimentos do ator. Ao cenário,
com painel de radiografias, é possível atribuir tantas interpretações quanto é
intrigante a exposição das chapas. A troca de figurino, de um robe-túnica
romano a um terno atual, pouco contribui para melhor situar o espectador. O uso
de microfone e a introdução de canção italiana também fazem parte da intenção
de tornar menos pretensioso o que pediria alguma solenidade. Luciano Chirolli com
físico e voz portentosos, tira partido dessas características numa atuação em
que lhe é exigida agilidade e projeção sonora. A imponência da sua figura não compensa
relativa uniformidade na apropriação das palavras nuançadas e na alternância de
estados emocionais definidos.