Giulia Nadruz: “Funny Girl” |
“BeetleJuice”, adaptação do cinema, procura relembrar, e também ampliar no teatro, o humor de gags e entrecho ingênuo da versão da tela. Se no nosso sotaque, citações brasileiríssimas compõem a trilha sonora e o histrionismo do elenco, não é possível esquecer a nacionalidade do passaporte da encenação. As convenções e os cacoetes do modelo estão intocáveis nas canções escritas em pauta de caderno de encargos e em escala de efeitos e técnicas saturadas. A maior contribuição nacional se concentra na decisão empresarial de montar “BeetleJuice”.
“O Jovem Frankenstein”, com mesma origem fílmica, não se desvia das normas dominantes dos teatros nova-iorquinos, mas com uma diferença no translado: a assinatura de Charles Moeller (direção) e Claudio Botelho (versão das letras). A dupla, desde os primeiras tentativas de transcrever nos palcos a cultivada admiração por musicais da Broadway (“Cole Porter – Ele Nunca Disse que me Amava”, “As Malvadas”) se empenha em ser fiel, em espírito, à alma do estilo. Ligados, por quase trinta anos, ao repertório “clássico” (de “A Noviça Rebelde” a “Como Vencer na Vida Sem Fazer Força”, de “O Violinista no Telhado” a “Gipsy”), circularam por áreas vizinhas (“Todos os musicais de Chico Buarque em 90 minutos”, “Sassaricando – E o Rio Inventou a Marchinha”, “Beatles Num Céu de Diamantes”). Em “Frankenstein...”, a eficácia na montagem de Charles/Botelho não se deixa arranhar por este musical rotineiro de frágil comicidade e esquecível trilha. Claudio e Charles foram também responsáveis por “Mamma Mia!¨, musical com libreto indolor para trilha anestesiante do Abba. Há pouco que fazer diante de tal material, mas o diretor e o versionista conseguiram o que talvez seja o maior êxito do gênero este ano. O público lotou o Teatro Multiplan, na Barra da Tijuca que, ao que parece, está se transformando na sede das “tradicionais “ comédias musicais no Rio.
Ana Carbatti: “Museu Nacional” |
A cidade é também o endereço do Cia. Barca dos Corações Partidos, que em pouco mais de uma década, estabeleceu novas técnicas e sonoridades na linguagem do musical brasileiro. Este ano, apresentou “Museu Nacional (Todas as Vozes do Fogo)”, tema infenso ao calor dos brilhos e a temperatura alta dos efeitos. Na curta, mas marcante carreira do grupo, já estão desenhadas as características originais e inconfundíveis dos músicos-atores. Com dinâmica cênica, em que a música é mais do que elemento complementar, a trilha ganha representação dançada de libretos ora biográficos (Jackson do Pandeiro, Ariano Suassuna, Luiz Gonzaga), ora construção simbiótica de música, dramaturgia e movimento com gramática inconfundível (“Auê”).
Bibi Ferreira: “Minha Querida Lady” |
No histórico dos musicais no Brasil com selo de importação, “My Fair Lady” (“Minha Querida Lady”, na tradução nacional”) abriu os portos, na década de 1960, para a entrada do modelo. Em transcrição direta, com diretores e equipes técnicas com know-how da franquia, o que se assistia aqui era cópia integral do que se criou por lá. “Hello Dolly”, “Chorus Line”, ”Evita”, “Fantasma da Ópera”, “Les Misérables”, “Chicago”, “Rei Leão”, se sucederam nas décadas seguintes, formando geração de atores, cantores e bailarinos que correspondiam, cada vez mais e com maior capacitação e ajustamento, aos padrões exigidos pelas empresas exportadoras. Em paralelo, desenhava-se, em especial na década de 1990, um tipo de musical à brasileira, com personagens da música e do teatro, que eram reverenciados como fórmula de integrar o repertório da vida com a vivência artística. Nesta temporada, essa fórmula, já desgastada, reencontrou em produções, nem sempre muito cuidadas, a possibilidade de atrair plateia. Dedicados a cantores e compositores (Ney Matogrosso, Clara Nunes, Gonzaguinha, Cazuza, Belchior, Dominguinhos, Zé Ramalho), a décadas, e estilos, literatura e até a hotéis, a oferta foi variada, mas um tanto tímida de fugir aos maneirismos das repetições.