quarta-feira, 25 de abril de 2018

Temporada 2018


Crítica do Segundo Caderno de O Globo (25/4/2018)

Crítica/ “A mulher de Bath”
Voz medieval que não chega aos dias de hoje

Geoffrey Chaucer (1343-1400), autor inglês de “Os contos da Cantuária”, teve um deles, “A mulher de Bath” transposto para a cena com Maitê Proença como atriz desse monólogo medieval, dirigido por Amir Haddad. A ideia, ao que parece, é aproximar relatos peregrinos ao túmulo de um certo São Thomas Beckett, a um feminismo avant-la-lettre, sacralizado pelos ensinamentos bíblicos. Viúva, que já enterrou cinco maridos, está à procura do sexto, empenhada em manter ativa sexualidade na mesma medida da sua intensa libido. Mas como o preceito religioso diz que o sexo é pecado fora da instituição do casamento religioso, os maridos se sucedem na busca de atender seus desejos irrestritos, sempre dentro da lei canônica. Não é fácil compreender o que atraiu a atriz-produtora a encenar texto do século 14, com proposições que, transpostas para a atualidade, soam anacrônicas na convivência feminina-masculina, imaginada  como comentários apropriados pelas experiências de hoje. É difícil assimilar a sintaxe original da linguagem, e acompanhar com interesse a descrição, com poucas variantes na modulação, de narrativa sem entrelinhas. As dificuldades são expostas pela própria montagem, que precisa ser explicada no início, adotando forma de conversa que desafia o tom medieval do que se segue. Com a irregularidade das gradações, resta espaço restrito para que a cena se concretiza, minimante, como estrutura teatral definida. As soluções, ou ausência delas, surgem como apontamentos aleatórios, que sustentam situação que pretende criar atmosfera para contexto verbal que a desmente. A improvisação visual da cenografia precária, as desnecessárias trocas de figurino, além das intervenções dispensáveis do ator-músico-sonoplasta-contra-regra, ampliam os descompassos de encenação que se enfraquece a cada momento dos seus longos 70 minutos.