quarta-feira, 2 de novembro de 2016

Temporada 2016

Crítica do Segundo Caderno de O Globo (2/11/2016)

Crítica/ “Cabeça”
Registro sonoro-documental de um álbum trintão

A apreensão do tempo, como registro e documento, determina as conexões cênicas de “Cabeça”, que em dois lados-atos percorre as 13 músicas do álbum “Cabeça dinossauro”, dos Titãs, lançado há 30 anos. O ano de 1986 é o ponto referencial para ajustar fatos e lembranças e introduzir cada faixa do disco, tocadas em ritmo geracional. As memórias que o repertório expande até a época da sua eclosão, se confundem com a ressonância, maior ou mais restrita, que provocou nos atores-músicos, hoje quarentões nostálgicos. Impulsionada pelas letras, a dramaturgia aponta para o mesmo registro contestador que investe na liberdade de linguagem, nas duras da polícia e preceitos de igrejas. Comentam-se essas provocações como similaridades extensivas à atualidade, repetindo em audiovisual o tom crítico juvenilmente datado do grupo. LP original e intervenções críticas e pessoais do elenco se equalizam na montagem  de Felipe Vidal, que por reproduzir a totalidade das composições, não mantém a mesma batida nas duas partes. Na segunda, o caráter provocativo que embala a primeira, se distancia na leveza de citações divertidas a marcas de produtos e a conversa em estúdio. A sequência discográfica cria previsibilidade na relação imagem-palavra-música, mas sem perder a individuação do som da banda. O diretor, que também é o cenógrafo e diretor musical, ao lado de Luciano Moreira, procura demonstrar como o disco ganha significação  no momento do seu lançamento e conserva integridade da marca Titãs. O videografismo de Eduardo Souza captura boas e oportunas imagens, que além de ilustrar, têm viés entre o humor e o documental, e a iluminação de Tomás Ribas empresta atmosfera de show de multidão. Em escala variável como intérpretes, uns mais atores, outros melhores músicos, todos ótimos instrumentistas, explodem no palco, traçando retrato sonoro de um disco com competência e identificação com os modelos inspiradores. Felipe Antello, Felipe Vidal, Guilherme Miranda, Gui Stutz, Leonardo Corajo, Lucas Gouvêa, Luciano Moreira e Sérgio Medeiros vão além de covers dos Titãs. Fazem um show incrementado, não só para os saudosos do “dinossauro”, mas também deslocam o olhar para os jurássicos anos 80.