quarta-feira, 28 de fevereiro de 2018

Temporada 2018


Crítica do Segundo Caderno de O Globo (7/3/2018)

Crítica/ Utopia D – 500 Anos Depois” 
Em busca da utopia cênica
Moacir Chaves volta, 13 anos depois da primeira versão, a “Utopia”, narrativa de sociedade quimérica por Thomas More (1478-1535), agora em edição compacta e com acréscimo ao título de “Utopia D – 500 anos depois”. Na carreira do diretor, que busca imprimir significados cênicos a relatos que se circunscrevem à sobriedade do literário ou à frieza dos documentos, essa sátira às instituições inglesas do século 16 e na edificação de corpo social imaginado, é um ponto referencial. Tanto como em 2005, o diretor encena fragmentos do original, que são repetidos em tonalidades variadas e entonações divergentes, alternando o dramático com o humor, a fala dançada com a pausa estrondosa. Aquilo que é dito de formas diferentes, ganha nas intenções, a unidade na crítica moralizante da política  e na ironia do jogo dos contrários. Fala-se, ceticamente, do tratamento dispensado aos que roubam para comer e dos castigos infligidos àqueles que cometem supostos crimes contra a sociedade. E ainda da vaidade das aparências. A reiteração dos textos, duplicados pelos formatos como são expressos, torna possível a tradução cênica, mas alcança, muito parcialmente a tentativa que imagina aproximar os tempos, atualizando a escrita de More. Há necessidade de dar consistência teatral à palavra-manifesto, que dissocia a verbalização do modo como é representada. A atual montagem agrava esse descompasso pela redução do elenco e o papel secundário da música. Antes, eram quatro atrizes. Hoje, um casal de atores. No passado, a distribuição no palco privilegiava a modulação pelas individualidades dos meios interpretativos do quarteto. Agora, se evidencia a descostura do ritmo. A música, antes mais interveniente, foi substituída por sonoridade acessória, e a produção, cenário, iluminação, figurino, agora bem modesta, reduzem ao básico o adensamento dos variantes climas de atuação. A dupla – Josie Antello e Julio Adrião – se desdobra na projeção de sentidos atribuídos a cada alternância de estilo, sustentando os silêncios entre os monólogos, mas se afastando dos julgamentos utópicos do autor, e das intenções do diretor de encontrar ressonâncias na atualidade.