quarta-feira, 6 de dezembro de 2017

Temporada 2017

Crítica do Segundo Caderno de O Globo (6/12/2017)

Crítica/ “Num lago dourado”
Da lágrima furtiva ao humor de resultado


A dramaturgia de “Num lago dourado” se parece com jogo de armar, com as peças encaixadas com funcionalidade a serviço do desenho da trama. O lugar de cada engate está previsto com técnica construtiva que segue plano previsto em detalhes. A comédia enternecedora equilibra a dose dramática do declínio que ameaça a velhice. As diferenças de gerações são registradas por comportamentos contrastados. A ambientação, marcada pela mudanças de estações, evoca a passagem do tempo. Com esses componentes, o autor Ernest Thompson escreve roteiro bem delimitado em seu território convencional e límpido na pretensão de capturar a plateia, balanceando sentimentalismo e humor. A estrutura narrativa revela a química teatral de Thompson, elaborada em laboratório de “playwriting” em que as poções dos ingredientes se provam com a infalibilidade da  fórmula matemática. Não há como escapar, na transposição cênica da temporada de dois velhinhos em casa de veraneio, da manufatura de produto embalado para consumo emotivo. Nesta versão, dirigida por Elias Andreato, Célia Forte atenuou a onipresente ameaça melodramática, buscando compensá-la com comicidade de resultado. A adaptadora não abandona o desejo da lágrima furtiva, mas não deixa que se sobreponha à facilidade do riso. A direção seguiu, fiel à maior comunicabilidade que a adaptação parece pretender, a linha da comédia que provoque reações esperadas no espectador conquistado. Como a montagem vive do previsível, Elias Andreato cumpre a função de manter, em velocidade de cruzeiro, rota muito explorada. O cenário de Marco Lima reproduz, com a mesma veracidade da fotografia ampliada de um lago, o ambiente de casa de campo. A iluminação de Wagner Freira procura, na cartela das intensidades luminosas, a mesma coloração mencionada no título. O quarteto do elenco – Tatiana de Marca, André Garolli, Fabiana Augusto e Lucas Abdo – desempenha, sem tropeços, papéis complementares ao do casal de velhinhos. Ana Lucia Torres, se distancia, ainda que parcialmente, de seu registro um tanto uniforme de interpretação. Ary Fontoura se ajusta ao personagem cômico-rabugento-senil imposto pela adaptação ao personagem melancólico-senil do texto original.