domingo, 25 de junho de 2017

Temporada 2017

Crítica do Segundo Caderno de O Globo (25/6/2017)

Crítica/ "Janis"
Voz de ressonância desesperada


O monólogo biográfico-musical de Diogo Liberano sobre a cantora Janis Joplin segue o roteiro convencional para traçar seu perfil cênico, utilizando entrevistas, depoimentos, cartas, e tantas outras referências de imagem do ídolo da música pop. Mas a construção do autor não se restringe à alternância de vivências com sequência musical para diálogo dramático entre o choque inconformado com o seu tempo e a força criativa dos imponderáveis da arte. A Janis Joplin que emerge desse contraste é alguém que ocupou o espaço da criação com os desajustes da vida. Um e outros se confundem para flagrar um rastilho de fragilidades em meio a eclosão de uma voz de ressonância desesperada. “Janis” não detalha a trajetória da garota do Texas que morreu aos 27 anos de overdose. Os fatos estão lá, contidos por narrativa que os relembram para transmitir sentimentos fugazes de quem encontrou na música o oxigênio para se manter respirando o mundo. São sopros ofegantes de sonoridade rasgada com que o texto modela os contornos das vulnerabilidades e impulsiona a fúria musical. O diretor Sérgio Módena acomodou a duplicidade de fôlegos em um mesmo compasso ritmado de conversa direta com a plateia, deslocando ao primeiro plano, a encenação da música. Se o autor procurou a integração dos extremos, a direção setorizou palavra e canto. Nada que atingisse a qualidade da direção musical de Ricco Viana e o poderoso som da banda formada por Antônio Van Ahn (teclado), Eduardo Rorato (bateria), Gilson Freitas (saxofone), Marcelo Müller (contrabaixo), e destaque para Artur Martau (guitarra). No centro da alta qualidade musical está Carol Fazu, que interpreta Janis Joplin numa extensão de corpo e voz que alcança a alma e a emoção daquela que a atriz define tão precisamente como personagem. Não são os adereços e a caracterização de figurino. Muito menos qualquer vaga lembrança mimética ou maneirismos vocais reprodutivos. Apenas uma intérprete, evocando com sua atuação, uma figura real, de viva presença imagética e de culto de geração. Carol Fazu se revela segura e íntegra na projeção de uma Janis com quem parecer ter intimidade e reverente convivência.