Crítica do
Segundo Caderno de O Globo (17/9/2016)
Crítica/ “Demônios”
Na noite que antecede o enterro de sua mãe, Frank
chega à casa e encontra mulher, Katarina, mergulhada no tédio tensionado de um
banho. É o ponto de partida para o enfretamento do casal, coadjuvado pelos vizinhos,
Jenna e Thomas, que vive um casamento convencional com embutidos sentimentos de
frustração. Os demônios das duplas se soltam ao impulso de ressentimentos
infernais que os mantêm perversamente unidos, numa noitada de desnudamento,
álcool e jogos verbais. A cada movimento de provocação, corresponde atitude de
dependência, em mútuo e destrutivo emaranhado de nós, que se mostram
impossíveis de ser desatados. A detalhada
exposição de amarguras, que o sueco Lars Norén projeta como um quadro realista de
rupturas na intimidade, recompõe os estilhaços de uma convivência esgarçada e
poluída de cinzas. Na tradição da dramaturgia nórdica, com acréscimos
inspirados no realismo psicológico americano (é impossível esquecer “Quem tem
medo de Virginia Woolf?”, de Edward Albee), a narrativa se realiza no tempo
dramático de uma noite, no espaço delimitado pela ação e com personagens interiorizados.
Por mais que essa estrutura sustente a dramaticidade explodida e os diálogos reveladores,
há que considerar alguma corrosão no tratamento e no desenvolvimento da trama,
impermeabilizada por truques e golpes de teatro. A direção de Bruce Gomlevsky é
sensível a esse desgaste de meios, não só na interpretação do elenco, como na
concepção cenográfica. Assinado em parceria com Bel Lobo, o cenário de Bruce
eleva a plateia a um plano acima da área de representação. Deste modo, o público
assiste, como um espectador curioso e distante, ao que se passa abaixo de seus
olhos. É dado a ele, o papel de voyeur, de assistente de um reality show, à espera do próximo embate
ou do que possa acontecer depois do bate boca. Os conflitos se exteriorizam, ganhando
relevância pelo que mostram, não pelo que simbolizam. A procura dos efeitos, seja
da nudez frontal ou da vulgaridade das palavras, higieniza, ao contrário de
provocar, as reais motivações de quem está vivendo um serão desesperado. A
montagem apazigua ainda mais as intenções do autor, criando uma cápsula para
acondicionar as eventuais labaredas, que acabam por se apresentar como fumaça. A
sensação de “já visto” que assalta, muitas vezes, a lembrança de outros dramas,
pode tornar “Demônios” um tanto corriqueiro,
mas que, ainda assim, conserva as suas potencialidades na versão de Bruce Gomlevsky.
Os atores se conduzem com movimentos em busca da precisão, limpos, depurados,
mas com suficiente dosagem emocional. Gustavo Damasceno (Thomas) retrata a
inquietude de Thomas até atingir a explosão raivosa. Thalita Godoi alinha com
gestos os afetos reprimidos de Jenna. Luiza Maldonado alterna, com pouca
variante, a composição física e emocional de Katarina. Bruce Gomlevsky adota um
tom sanguíneo, escondendo as dubiedades do Frank