sábado, 26 de abril de 2014

Festivais

3ª Cena Brasil Internacional
O gesto físico ao encontro do movimento interior

Dos à Deux – Segundo Ato é a recriação do primeiro espetáculo da dupla Artur Ribeiro e André Curti, estreado em 1998, e que daria o nome do grupo em atividade até hoje, na França e no Brasil. Assistir ao início do trabalho de criação de Ribeiro e Curti só confirma a base sólida sob a qual se estabelece trajetória de coerência estilística e de permanente investigação dos fundamentos expressivos. Nesta montagem, os personagens evocam  Esperando Godot  e a ambientação lembra imagens de Beckett, mas o tempo cênico é marcado por poética agridoce própria, na qual o gesto físico busca figurar o movimento interior. Os dois vagabundos, soltos sob uma árvore seca, se debatem numa constante disputa por pequenas conquistas em interminável procura de um lugar de precedência no nada. Com dois dispositivos cênicos (cadeiras que se desdobram em formas geometricamente mutáveis), iluminação de sensíveis zonas de sombras e de luminosidade e música essencial à atuação sem palavras (trilha e composições originais de Fernando Mota), os dois atores franceses, Clément Chaboche e Guillaume le Pape, que substituem Ribeiro e Curti, intérpretes da versão original, reproduzem o fluxo de movimentos que constroem tão refinadamente a narrativa. Para além da segurança técnica na realização desse balé-malabarista-corporal-tragicômico, Chaboche e Pape desempenham uma coreografia dramatúrgica em que os gestos nascem de uma ideia cênica, que se transforma em outra, sem que o espectador se dê conta da passagem. É um turbilhão gestual que retira da ação física sua projeção dramática e poética. Dos à Deux – Segundo Ato traçou os rumos de um grupo que com o seu último espetáculo, Irmãos de Sangue, demonstrou que, se mantendo fiel ao primeiro impulso, encontrou forças renovadoras para demarcar, na décima montagem depois,  a sua vigorosa permanência.