segunda-feira, 31 de março de 2014

Temporada 2014

Crítica do Segundo Caderno de O Globo (30/3/2014)

Crítica/  Se eu Fosse Você – O Musical
Material reciclado na troca de gêneros 

Tal como na troca de corpos dos personagens, Se eu Fosse Você, o Musical faz um intercâmbio de gêneros, modifica vozes e inverte papéis em enredo de encaixes que procura repetir o sucesso do filme que o inspirou. A comédia cinematográfica se transforma em libreto, que é apoiado por repertório musical preexistente, ilustrativo para situações e diálogos um tanto impermeáveis à transferência de linguagens. O roteiro de Flavio Marinho costura com a habilidade possível diante dos condicionantes da tela (a trama e o êxito) e das canções de Rita Lee (a marca e a popularidade) alguma autonomia expressiva, que se perde na incompatibilidade das partes em harmonizar o todo. A montagem, dirigida e coreografada por Alonso Barros, também demonstra estar destinada a repetir fórmulas e confirmar referências, sem qualquer sinal a indicar intenção de recriar com menos convencionalismo. A impressão é a de que se assiste a um produto reciclado, que cada elemento em cena reproduz algo já visto. O cenário, com excesso de dispositivos que circulam pelo palco e com projeções que simplificam mais ainda a pálida ambientação, lembra visuais de tantos outros musicais. A coreografia, que faz várias citações, segue passos bem tradicionais. O figurino bastante colorido na sua indefinição estilística monocromática relembra roupas descaracterizadas no tempo. A comédia em si procura ter vida cênica própria, em paralelo ao aspecto espetacular do musical, acentuando o descompasso entre os gêneros. A extensa introdução até a mudança dos corpos, a chave de humor da narrativa, se torna pretexto para a inserção das vinhetas musicais, o  que alonga a duração do espetáculo e dilui o efeito cômico. A direção musical de Guto Graça Melo encontra padronização sonora que permite tratamento teatral às canções, desprendidas dos arranjos originais da cantora-compositora. O elenco de 24 atores-cantores-bailarinos cumpre com disciplina física e técnica vocal as exigências de compor conjunto cenicamente equilibrado. Atores – Osvaldo Mil, Nicola Lama, Bruno Sigrist, Carlos Arruza, Giselle Lima e Carla Daniel – em participações divertidas, intérpretes com excelentes vozes – Kacau Gomes, Marya Bravo e Lua Branco -, atriz de recursos cômicos – Fafy Siqueira – e a presença do casal protagonista –  Claudia Netto e Nelson Freitas – sustentam a atabalhoada transcrição nacional do que se convencionou chamar de comédia musical em teatros anglo-saxões.