domingo, 18 de março de 2012

Pina Bausch no Cinema


 Encruzilhada Onírica de Linguagens
Evocações para além das palavras
O documentário de Wim Wenders sobre as criações de Pina Bausch é bem mais do que o registro das coreografias de uma das artistas mais instigantes do século 20. Pina, filme de 130 minutos, que utiliza o 3D para aproximar o espectador da pulsão de gestos, que expressam feixe de tensões dramáticas num cenário de sentimentos em permanente fricção, justifica a definição da fundadora da companhia de Wuppertal de que seus bailarinos dançavam o teatro, teatralizavam a dança. Na captação das imagens de coreografias e de depoimentos de membros da companhia e, mais parcamente, da própria Pina, Wenders é econômico nas palavras. Os closes e o olhar invadem, tridimensionalmente, a tela, como se a platéia pudesse penetrar na cena, perceber suores, ouvir arfares, acompanhar ritmos retirados de mãos batidas nos corpos. “As palavras apenas evocam as coisas. É aí, que entra a dança”, como diz Pina Bausch, das poucas vezes que explica seu arrebatamento rigoroso à procura de significar o mundo em que vive e de falar através do movimento. O filme se apropria , seja no que relembram os bailarinos, seja no que destaca Wenders, do universo de uma mulher intensa, mas de abissais silêncios. Cada um dos dançarinos, vindos de mundos e culturas tão distantes – de brasileira a orientais, de alemães a italianas, de latinos a escandinavos – e de tipos físicos e idades tão contrastadas, mencionam aquela que provocava sem mapas de localização, apenas com rotas de investigação. Um deles, ouviu da diretora a proposta do percurso: “signifique a lua com o corpo”. É dele, corpo, que suas coreografias adquirem a dramática que reflete o tempo da criação. E dos quatro elementos que extrai o cenário vivo de corpos que se tensionam e desabam, se tocam e se excluem, se completam e se inconcluem, quase levitando. O olhar, ao qual Pina atribuiu a dimensão teatral da exclusão, ganha em Café Müller a visão penetrante do gesto para além das cegueiras. A transposição da sala de espetáculo para a beleza dos insuspeitados exteriores da cidade de Wuppertal acrescenta aos movimentos de inexcedível força expressiva, ambientação, de urbano futurismo e da natureza manipulada pelo homem. O encontro do cinema com a dança, feita teatro por amálgama onírico, transforma a encruzilhada de linguagens em síntese de uma artista  em que o trabalho a impulsionou até a morte a roçar a plenitude da criação.           

                                                     macksenr@gmail.com